No filme "O Sorriso de Monalisa" está retratada – acredito que fielmente – a realidade americana do trabalho docente feminino na década de 50. Em meio a momentos cômicos, épicos e dramáticos, ele apresenta situações em que a disciplina de arte tinha o mesmo peso que a de prendas domésticas, matéria obrigatória, para as meninas, naquela época.
A história contada no filme é a de uma professora feminista, Katherine Watson, que foi contratada para dar aulas de História da Arte num bem conceituado e tradicional colégio de moças, o Wellesley College, na Nova Inglaterra, após deixar o Estado da Califórnia onde residia, alcançando um sonho profissional.
Katherine Watson esperava ali encontrar as alunas mais inteligentes e brilhantes dos EUA. No entanto, ela se vê entre as meninas mais inteligentes sim, mas desprovidas de qualquer pretensão profissional. São alunas preocupadas apenas em casarem-se, constituírem família, serem boas esposas e mães, terem filhos e pronto! A professora, então, tenta incentivá-las, apesar de ir contra todas as convenções escolares e sociais vigentes – já que a Wellesley era uma escola tradicionalíssima –, a serem mais do que "boas esposas", e toma a iniciativa, inclusive, de matricular uma delas num curso de Direito, pois esta aluna havia confidenciado a ela o desejo de estudar este curso. Com esta atitude o que a mestra consegue é a antipatia de algumas das meninas.
Neste colégio reina o autoritarismo, com suas regras e seus métodos, tanto de conduta quanto de ensino, totalmente pré-definidos.
Embora o filme decorra dos anos 50, seu contexto será sempre atual, pois aborda um tempo que realmente existiu, ainda parece existir e não pode ser esquecido – que, infelizmente, temos esbarrado nele camufladamente em algumas várias instituições escolares. Ele enfatiza, de uma forma clássica e bela, o papel para o qual a mulher nasceu para desempenhar, segundo os padrões da época, limitando-a ao sagrado matrimônio, casa, marido e filhos. Ensina, ainda, como iniciou-se a luta feminina pelo seu querer, pela conquista do seu espaço numa sociedade até então inteiramente machista, mesmo que para isso alguns tabus fossem violados. E, finalmente, como se pode notar, é um filme crítico à rigidez social dominante do início do séc. XX e, considero, imperdível para se entender um pouco da trajetória histórica do trabalho docente até aquele momento.
Apesar de ter forte semelhança com o filme "SOCIEDADE DOS POETAS MORTOS", mostrou duas tendências pedagógicas: Tradicional e Progressista.
A tendência tradicional predominou no papel da escola, da família e na concepção de educação, onde a preparação intelectual e moral dos alunos era para assumir seu papel na sociedade, acumulados através dos tempos e repassados aos alunos como verdades absolutas.
Já a tendência progressista esteve presente na figura da professora, que serviu de inspiração para suas alunas, após decidir lutar contra normas conservadoras da escola em que trabalhava, na tentativa de abrir a mente de suas alunas para um pensamento liberal, enfrentando a administração da instituição e até mesmo de algumas alunas. Ela também estava imbuída da idéia de que através de suas aulas era possível dar maior autonomia e preparo para que suas alunas enfrentem o mundo, entretanto, muito mais que uma profissional em busca de renovação em seu trabalho pedagógico, ela era o protótipo da mulher moderna, livre, desimpedida e que queria quebrar as barreiras do mundo machista em que vivia.
Demonstrou ainda:
- CADA OLHAR TEM UMA PECULIARIDADE.
- A REALIDADE PODE SER VISTA DE VÁRIOS PONTOS DE VISTA, E NÃO A VISTA DE UM PONTO.
- COMPLEXIDADE DO SER HUMANO.
- OS SENTIMENTOS ENVOLVIDOS.
Portanto, ser educador/professor significa muito mais que ensinar, pois essa missão está intrinsecamente ligada ao dom , vontade, persistência e amor a profissão.
sexta-feira, 28 de setembro de 2007
terça-feira, 25 de setembro de 2007
Frase do Dia
“Se planejamos para um ano, devemos plantar cereais. Se planejamos para uma década, devemos plantar árvores. Se planejamos para uma vida toda, devemos educar e treinar o homem” (autor desconhecido).
sexta-feira, 21 de setembro de 2007
Mudar a forma de ensinar e de aprender com tecnologias
Apresentação
"Um indivíduo consegue hoje um diploma de curso superior sem nunca ter aprendido a comunicar-se, a resolver conflitos, a saber o que fazer com a raiva e outros sentimentos negativos" (Carl Rogers)
Educar é colaborar para que professores e alunos nas escolas e organizações - transformem suas vidas em processos permanentes de aprendizagem. É ajudar os alunos na construção da sua identidade, do seu caminho pessoal e profissional - do seu projeto de vida, no desenvolvimento das habilidades de compreensão, emoção e comunicação que lhes permitam encontrar seus espaços pessoais, sociais e de trabalho e tornar-se cidadãos realizados e produtivos.
Educamos de verdade quando aprendemos com cada coisa, pessoa ou idéia que vemos, ouvimos, sentimos, tocamos, experienciamos, lemos, compartilhamos e sonhamos; quando aprendemos em todos os espaços em que vivemos na família, na escola, no trabalho, no lazer, etc. Educamos aprendendo a integrar em novas sínteses o real e o imaginário; o presente e o passado olhando para o futuro; ciência, arte e técnica; razão e emoção.
De tudo, de qualquer situação, leitura ou pessoa podemos extrair alguma informação, experiência que nos pode ajudar a ampliar o nosso conhecimento, seja para confirmar o que já sabemos, seja para rejeitar determinadas visões de mundo
Na educação - nas organizações empresariais ou escolares - buscamos o equilíbrio entre a flexibilidade (que está ligada ao conceito de liberdade) e a organização (onde há hierarquia, normas, maior rigidez). Com a flexibilidade procuramos adaptar-nos às diferenças individuais, respeitar os diversos ritmos de aprendizagem, integrar as diferenças locais e os contextos culturais. Com a organização, buscamos gerenciar as divergências, os tempos, os conteúdos, os custos, estabelecemos os parâmetros fundamentais. Avançaremos mais se soubermos adaptar os programas previstos às necessidades dos alunos, criando conexões com o cotidiano, com o inesperado, se transformarmos a sala de aula em uma comunidade de investigação.
Ensinar de formas diferentes para pessoas diferentes
Com a Internet estamos começando a ter que modificar a forma de ensinar e aprender tanto nos cursos presenciais como nos de educação continuada, a distância. Só vale a pena estarmos juntos fisicamente - num curso empresarial ou escolar - quando acontece algo significativo, quando aprendemos mais estando juntos do que pesquisando isoladamente nas nossas casas. Muitas formas de ensinar hoje não se justificam mais. Perdemos tempo demais, aprendemos muito pouco, nos desmotivamos continuamente. Tanto professores como alunos temos a clara sensação de que em muitas aulas convencionais perdemos muito tempo.
Podemos modificar a forma de ensinar e de aprender. Um ensinar mais compartilhado. Orientado, coordenado pelo professor, mas com profunda participação dos alunos, individual e grupalmente, onde as tecnologias nos ajudarão muito, principalmente as telemáticas.
Ensinar e aprender exigem hoje muito mais flexibilidade espaço-temporal, pessoal e de grupo, menos conteúdos fixos e processos mais abertos de pesquisa e de comunicação. Uma das dificuldades atuais é conciliar a extensão da informação, a variedade das fontes de acesso, com o aprofundamento da sua compreensão, em espaços menos rígidos, menos engessados. Temos informações demais e dificuldade em escolher quais são significativas para nós e conseguir integrá-las dentro da nossa mente e da nossa vida.
A aquisição da informação, dos dados dependerá cada vez menos do professor. As tecnologias podem trazer hoje dados, imagens, resumos de forma rápida e atraente. O papel do professor - o papel principal - é ajudar o aluno a interpretar esses dados, a relacioná-los, a contextualizá-los.
Aprender depende também do aluno, de que ele esteja pronto, maduro, para incorporar a real significação que essa informação tem para ele, para incorporá-la vivencialmente, emocionalmente. Enquanto a informação não fizer parte do contexto pessoal - intelectual e emocional - não se tornará verdadeiramente significativa, não será aprendida verdadeiramente.
Hoje temos um amplo conhecimento horizontal - sabemos um pouco de muitas coisas, um pouco de tudo. Falta-nos um conhecimento mais profundo, mais rico, mais integrado; o conhecimento diferente, desvendador, mais amplo em todas as dimensões.
Uma parte das nossas dificuldades em ensinar se deve também a mantermos no nível organizacional e interpessoal formas de gerenciamento autoritário, pessoas que não estão acompanhando profundamente as mudanças na educação, que buscam o sucesso imediato, o lucro fácil, o marketing como estratégia principal.
O professor é um facilitador, que procura ajudar a que cada um consiga avançar no processo de aprender. Mas tem os limites do conteúdo programático, do tempo de aula, das normas legais. Ele tem uma grande liberdade concreta, na forma de conseguir organizar o processo de ensino-aprendizagem, mas dentro dos parâmetros básicos previstos socialmente.
O aluno não é unicamente nosso cliente que escolhe o que quer. É um cidadão em desenvolvimento. Há uma interação entre as expectativas dos alunos, as expectativas institucionais e sociais e as possibilidades concretas de cada professor. O professor procura facilitar a fluência, a boa organização e adaptação do curso a cada aluno, mas há limites que todos levarão em consideração. A personalidade do professor é decisiva para o bom êxito do ensino-aprendizagem. Muitos não sabem explorar todas as potencialidades da interação.
Se temos que trabalhar com um grupo, não poderemos provavelmente preencher todas as expectativas individuais. Procuraremos encontrar o ponto de equilíbrio entre as expectativas sociais, as do grupo e as individuais. Quando há uma diferença intransponível entre as expectativas grupais e algumas expectativas individuais, incontornáveis a curto prazo, ainda assim, na educação, procuraremos adaptar flexivelmente as propostas, as técnicas, a avaliação (prazo maior, diferentes formas de avaliação). Somente no fim deste processo podemos julgar negativamente - reprovar o outro. É cômodo para o educador jogar sempre a culpa nos alunos, dizendo que não estão preparados, que são problemáticos. A criatividade está em encontrar formas de aproximação dos alunos às nossas propostas, à nossa pessoa.
Não podemos dar aula da mesma forma para alunos diferentes, para grupos com diferentes motivações. Precisamos adaptar nossa metodologia, nossas técnicas de comunicação a cada grupo. Tem alunos que estão prontos para aprender o que temos a oferecer. É a situação ideal, onde é fácil obter a sua colaboração. Alunos mais maduros, que necessitam daquele curso ou que escolheram aquela matéria livremente facilitam nosso trabalho, nos estimulam, colaboram mais facilmente.
Outros alunos, no início do curso podem estar distantes, mas sabendo chegar até eles, mostrando-nos abertos, confiantes e motivadores, sensibilizando-os para o que eles vão aprender no nosso curso, respondem bem e se dispõem a participar. A partir daí torna-se fácil ensinar.
Existem outros que não estão prontos, que são imaturos ou estão distantes das nossas propostas. Procuraremos aproximá-las o máximo que pudermos deles, partindo do que eles valorizam, do que para eles é importante. Mas se, mesmo assim, a resposta é fria, poderemos apelar para algumas formas de impor tarefas, prazos, avaliações mais freqüentes, de forma madura, mostrando que é pelo bem deles e não como forma de vingança nossa. O professor pode impor sem ser autoritário, sem humilhar, colocando as tarefas de forma clara, calma e justificada. A imposição é um último recurso do professor, não primeiro e único. Sempre que for possível, avançaremos mais pela interação, pela colaboração, pela pesquisa compartilhada do que pela imposição.
Transformar a aula em pesquisa e comunicação
Vejo as aulas nas organizações - como processos contínuos de comunicação e de pesquisa, onde vamos construindo o conhecimento em um equilíbrio entre o individual e o grupal, entre o professor-coordenador-facilitador e os alunos-participantes ativos. Aula-pesquisa, onde professor motiva, incentiva, dá os primeiros passos para sensibilizar o aluno para o valor do que vamos fazer, para a importância da participação do aluno neste processo. Aluno motivado e com participação ativa avança mais, facilita todo o nosso trabalho. Depois da sensibilização - verbal, audiovisual - o aluno - às vezes individualmente e outras em pequenos grupos - procura suas informações, faz a sua pesquisa na Internet, em livros, em contato com experiências significativas, com pessoas ligadas ao tema..
Os grandes temas da matéria são coordenados pelo professor, iniciados pelo professor, motivados pelo professor, mas pesquisados pelos alunos, às vezes todos simultaneamente; às vezes, em grupos; às vezes, individualmente.
Uma parte da pesquisa pode ser feita "ao vivo" (juntos fisicamente); outras, "off line" (cada um pesquisa no seu espaço e tempo preferidos). Ao vivo, o professor está atento às descobertas, às dúvidas, ao intercâmbio das informações (os alunos pesquisam, escolhem, imprimem), ao tratamento das informações. O professor ajuda, problematiza, incentiva, relaciona.
Ao mesmo tempo, o professor coordena as trocas, os alunos relatam suas descobertas, socializam suas dúvidas, mostram os resultados de pesquisa. Se possível, todos recebem uma seleção dos melhores materiais descobertos pelos alunos, junto com os do professor (textos impressos ou colocados a disposição pelo professor ou indicados em sites da Internet).
Os alunos levam para casa os textos, onde aprofundam a sua leitura, fazem novas sínteses, colocam os problemas que os textos suscitam, os relacionam com a sua realidade.
Essa pesquisa é comunicada em classe para os colegas e o professor procura ajudar a contextualizar, a ampliar o universo alcançado pelos alunos, a problematizar, a descobrir novos significados no conjunto das informações trazidas. Esse caminho de ida e volta, onde todos se envolvem, participam é fascinante, criativo, cheio de novidades e de avanços. O conhecimento que é elaborado a partir da própria experiência se torna muito mais forte e definitivo em nós.
Junto com a pesquisa coletiva, o professor incentiva a pesquisa individual ou projetos de grupo. Cada aluno -pessoalmente ou em dupla - escolhe um tema mais específico da matéria e que é do interesse também do aluno. Esse tema é pesquisado pelo aluno com orientação do professor. É apresentado à classe. É distribuído aos colegas. É divulgado na Internet.
É importante neste processo dinâmico de aprender pesquisando, utilizar todos os recursos, todas as técnicas possíveis por cada professor, por cada instituição, por cada classe. Vale a pena descobrir as competências dos alunos que temos em cada classe, que contribuições podem dar ao nosso curso. Não vamos impor um projeto fechado de curso, mas um programa com as grandes diretrizes delineadas e onde vamos construindo caminhos de aprendizagem em cada etapa, estando atentos - professor e alunos - para avançar da forma mais rica possível em cada momento.
Quando vale a pena encontrar-nos na sala de aula?
Iremos combinando daqui em diante cursos presenciais com virtuais, períodos de pesquisa mais individual com outros de pesquisa e comunicação conjunta. Alguns cursos poderemos fazê-los sozinhos com a orientação virtual de um tutor e em outros será importante compartilhar vivências, experiências, idéias.
Quando vale a pena encontrar-nos fisicamente numa sala de aula?
Como regra geral, no começo e no final de um novo tema, de um assunto importante. No início, para colocar esse tema dentro de um contexto maior, para motivar os alunos, para que percebam o que vamos pesquisar e para organizar como vamos pesquisá-lo. Os alunos, iniciados ao novo tema e motivados, o pesquisam, sob a supervisão do professor e voltam a aula depois de um tempo para trazer os resultados da pesquisa, para colocá-los em comum. É o momento final do processo, de trabalhar em cima do que os alunos apresentaram, de complementar, questionar, relacionar o tema com os demais.
Vale a pena encontrar-nos no início de um processo específico de aprendizagem e no final, na hora da troca, da contextualização. Uma parte das aulas pode ser substituída por acompanhamento, monitoramento de pesquisa, onde o professor dá subsídios para os alunos irem além das primeiras descobertas, para ajudá-los nas suas dúvidas. Isso pode ser feito pela Internet, por telefone ou pelo contato pessoal com o professor.
Na medida em que avançam as tecnologias de comunicação virtual, o conceito de presencialidade também se altera. Podemos ter professores externos compartilhando determinadas aulas, um professor de fora "entrando" por videoconferência na minha aula. Haverá um intercâmbio muito maior de professores, onde cada um colabora em algum ponto específico, muitas vezes a distância.
O conceito de curso, de aula também muda. Hoje entendemos por aula um espaço e tempo determinados. Esse tempo e espaço cada vez serão mais flexíveis. O professor continua "dando aula" quando está disponível para receber e responder mensagens dos alunos, quando cria uma lista de discussão e alimenta continuamente os alunos com textos, páginas da Internet, fora do horário específico da sua aula. Há uma possibilidade cada vez mais acentuada de estarmos todos presentes em muitos tempos e espaços diferentes, quando tanto professores quanto os alunos estão motivados e entendem a aula como pesquisa e intercâmbio, supervisionados, animados, incentivados pelo professor.
Poderemos também oferecer cursos predominantemente presenciais e outros predominantemente virtuais. Isso dependerá do tipo de matéria, das necessidades concretas de cobrir falta de profissionais em áreas específicas ou de aproveitar melhor especialistas de outras instituições que seria difícil contratar.
Educar o educador
De um professor espera-se, em primeiro lugar, que seja competente na sua especialidade, que conheça a matéria, que esteja atualizado. Em segundo lugar, que saiba comunicar-se com os seus alunos, motivá-los, explicar o conteúdo, manter o grupo atento, entrosado, cooperativo, produtivo.
Muitos se satisfazem em ser competentes no conteúdo de ensino, em dominar determinada área de conhecimento e em aprimorar-se nas técnicas de comunicação desse conteúdo. São os professores bem preparados, que prestam um serviço importante socialmente em troca de uma remuneração, em geral, mais baixa do que alta.
Na educação, escolar ou empresarial, precisamos de pessoas que sejam competentes em determinadas áreas de conhecimento, em comunicar esse conteúdo aos seus alunos, mas também que saibam interagir de forma mais rica, profunda, vivencial, facilitando a compreensão e a prática de formas autênticas de viver, de sentir, de aprender, de comunicar-se. Ao educar facilitamos, num clima de confiança, interações pessoais e grupais que ultrapassam o conteúdo para, através dele, ajudar a construir um referencial rico de conhecimento, de emoções e de práticas.
As mudanças na educação dependem, em primeiro lugar, de termos educadores maduros intelectual e emocionalmente, pessoas curiosas, entusiasmadas, abertas, que saibam motivar e dialogar. Pessoas com as quais valha a pena entrar em contato, porque dele saímos enriquecidos.
Os grandes educadores atraem não só pelas suas idéias, mas pelo contato pessoal. Dentro ou fora da aula chamam a atenção. Há sempre algo surpreendente, diferente no que dizem, nas relações que estabelecem, na sua forma de olhar, na forma de comunicar-se. São um poço inesgotável de descobertas.
Enquanto isso, boa parte dos professores é previsível, não nos surpreende; repete fórmulas, sínteses.
O contato com educadores entusiasmados atrai, contagia, estimula, os torna próximos da maior parte dos alunos. Mesmo que não concordemos com todas as suas idéias, os respeitamos.
As primeiras reações que o bom professor e educador despertam no aluno são a confiança, a admiração e o entusiasmo. Isso facilita enormemente o processo de ensino-aprendizagem.
As mudanças na educação dependem também de termos administradores, diretores e coordenadores mais abertos, que entendam todas as dimensões que estão envolvidas no processo pedagógico, além das empresariais ligadas ao lucro; que apoiem os professores inovadores, que equilibrem o gerenciamento empresarial, tecnológico e o humano, contribuindo para que haja um ambiente de maior inovação, intercâmbio e comunicação.
As mudanças na educação dependem também dos alunos. Alunos curiosos, motivados, facilitam enormemente o processo, estimulam as melhores qualidades do professor, tornam-se interlocutores lúcidos e parceiros de caminhada do professor-educador.
Alunos motivados aprendem e ensinam, avançam mais, ajudam o professor a ajudá-los melhor. Alunos que provêm de famílias abertas, que apóiam as mudanças, que estimulam afetivamente os filhos, que desenvolvem ambientes culturalmente ricos, aprendem mais rapidamente, crescem mais confiantes e se tornam pessoas mais produtivas.
Educação para a autonomia e para a cooperação
A educação avança pouco - nas organizações empresariais e nas escolas - porque ainda estamos profundamente inseridos em organizações autoritárias, em processos de ensino e aprendizagem controladores, com educadores pouco livres, mal resolvidos, que repetem mais do que pesquisam, que impõem mais do que se comunicam, que não acreditam no seu próprio potencial nem no dos seus alunos, que desconhecem o quanto eles e seus alunos podem realizar!.
Um dos eixos das mudanças na educação passa pela transformação da educação em um processo de comunicação autêntica, aberta entre professores e alunos, principalmente, mas também incluindo administradores e a comunidade (todos os envolvidos no processo organizacional). Só vale a pena ser educador dentro de um contexto comunicacional participativo, interativo, vivencial. Só aprendemos profundamente dentro deste contexto. Não vale a pena ensinar dentro de estruturas autoritárias e ensinar de forma autoritária. Pode até ser mais eficiente a curto prazo - os alunos aprendem rapidamente determinados conteúdos programáticos - mas não aprendem a ser pessoas, a ser cidadãos.
Sei que parece uma ingenuidade falar de comunicação autêntica numa sociedade altamente competitiva, onde cada um se expõe até determinado ponto e, na maior parte das vezes, se esconde, em processos de comunicação aparentes, cheios de desconfiança, quando não de interações destrutivas. As organizações que quiserem evoluir terão que aprender a reeducar-se em ambientes mais significativos de confiança, de cooperação, de autenticidade. Isso as fará crescer mais, estar mais atentas às mudanças necessárias.
Com ou sem tecnologias avançadas podemos vivenciar processos participativos de compartilhamento de ensinar e aprender (poder distribuído) através da comunicação mais aberta, confiante, de motivação constante, de integração de todas as possibilidades da aula-pesquisa/aula-comunicação, num processo dinâmico e amplo de informação inovadora, reelaborada pessoalmente e em grupo, de integração do objeto de estudo em todas as dimensões pessoais: cognitivas, emotivas, sociais, éticas e utilizando todas as habilidades disponíveis do professor e do aluno.
É importante educar para a autonomia, para que cada um encontre o seu próprio ritmo de aprendizagem e, ao mesmo tempo, é importante educar para a cooperação, para aprender em grupo, para intercambiar idéias, participar de projetos, realizar pesquisas em conjunto.
Só podemos educar para a autonomia, para a liberdade com autonomia e liberdade. Uma das tarefas mais urgentes é educar o educador para uma nova relação no processo de ensinar e aprender, mais aberta, participativa, respeitosa do ritmo da cada aluno, das habilidades específicas de cada um.
O caminho para a autonomia acontece combinando equilibradamente a interação e a interiorização. Pela interação aprendemos, nos expressamos, confrontamos nossas experiências, idéias, realizações; pela interação buscamos ser aceitos, acolhidos pela sociedade, pelos colegas, por alguns grupos significativos. Pela interiorização fazemos a integração de tudo, das idéias, interações, realizações em nós, vamos encontrando nossa síntese, nossa identidade, nossa marca pessoal, nossa diferença.
A tecnologia nos propicia interações mais amplas, que combinam o presencial e o virtual. Somos solicitados continuamente a voltar-nos para fora, a distrair-nos, a copiar modelos externos, o que dificulta o processo de interiorização, de personalização. O educador precisa estar atento para utilizar a tecnologia como integração e não como distração ou fuga.
O educador autêntico é humilde e confiante. Mostra o que sabe e, ao mesmo tempo está atento ao que não sabe, ao novo. Mostra para o aluno a complexidade do aprender, a sua ignorância, suas dificuldades. Ensina, aprendendo a relativizar, a valorizar a diferença, a aceitar o provisório. Aprender é passar da incerteza a uma certeza provisória que dá lugar a novas descobertas e a novas sínteses.
Experiências pessoais de ensino utilizando a Internet
Venho desenvolvendo algumas experiências no ensino de graduação e de pós-graduação na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Criei uma página pessoal na Internet, no endereço www.eca.usp.br/prof/moran. Nela constam as disciplinas de pós-graduação - Redes eletrônicas na Educação e Novas Tecnologias para uma Nova Educação - e três de graduação - Novas Fronteiras da Televisão, Legislação e Ética do Radialismo e Mercadologia de Rádio e Televisão - com o programa e alguns textos meus e dos meus alunos. O roteiro básico é o seguinte: no começo do semestre, cada aluno escolhe um assunto específico dentro da matéria, vai pesquisando-o na Internet e na biblioteca. Ao mesmo tempo, pesquisamos também temas básicos do curso. O aluno apresenta os resultados da sua pesquisa específica na classe e depois pode divulgá-los, se quiser, através da Internet.
Disponho de duas salas de aula com dez computadores em uma e quatorze em outra, ligados à Internet por fibra ótica, para vinte alunos, em média. Utilizamos essa sala a cada duas ou três semanas. As outras aulas acontecem na sala convencional.
O fato de ver o seu nome na Internet e a possibilidade de divulgar os seus trabalhos e pesquisas, exerce uma forte motivação nos alunos, os estimula a participar mais em todas as atividades do curso. Enquanto preparam os trabalhos pessoais, vou desenvolvendo com eles algumas atividades.
Começamos com uma aula introdutória para os que não estão familiarizados com a Internet. Nela aprendemos a conhecer e a usar as principais ferramentas. Fazemos pesquisa livre, em vários programas de busca. Cadastramos a cada aluno para que tenha o seu e mail pessoal (na própria universidade ou em sites que oferecem endereços eletrônicos gratuitamente).
Num segundo momento, todos pesquisamos um tópico importante do programa. É importante sensibilizar o aluno antes para o que se quer conseguir neste momento, neste tópico. Se o aluno tem claro ou encontra valor no que vai pesquisar, o fará com mais rapidez e eficiência. O professor precisa estar atento, porque a tendência na Internet é para a dispersão fácil. O intercâmbio constante de resultados, a supervisão do professor podem ajudar a obter melhores resultados. Eles vão gravando os endereços, artigos e imagens mais interessantes em disquete e também fazem anotações escritas, com rápidos comentários sobre o que estão salvando. As descobertas mais importantes são comunicadas aos colegas. Imprimem os textos mais significativos. No final, os alunos comunicam os principais resultados da sua busca e encontramos os principais pontos de apoio para analisar o tema do dia. Professor e alunos relacionam as coincidências e divergências entre os resultados encontrados e as informações já conhecidas em reflexões anteriores, em livros e revistas.
O meu papel é o de acompanhar cada aluno, incentivá-lo, resolver suas dúvidas, divulgar as melhores descobertas. As aulas na Internet se alternam com as aulas habituais, onde acrescentamos textos escritos, vídeos para aprofundar os temas pesquisados inicialmente na Internet. Posteriormente, cada aluno desenvolve um tema específico de pesquisa, que ele escolhe, conciliando o seu interesse pessoal e o da matéria. É interessante que os alunos escolham algum assunto dentro do programa que esteja mais próximo do que eles valorizam mais. Essas pesquisas podem ser realizadas dentro e fora do período de aula. Estou junto com eles, dando dicas, tirando dúvidas, anotando descobertas. Esses temas específicos são mais tarde apresentados em classe para os colegas. O professor complementa, questiona, relaciona essas apresentações com a matéria como um todo. Alguns alunos criam suas páginas pessoais e outros entregam somente os resultados das suas pesquisas para colocá-los na minha página.
Além das aulas, acontece um estimulante processo de comunicação virtual, junto com o presencial. Eles podem pesquisar em uma sala especial em qualquer horário, se houver máquinas livres. Os alunos me procuram mais para atendimento específico na minha sala, e também enviam mensagens eletrônicas. Como todos têm e-mail, envio com freqüência textos, endereços, idéias, sugestões em uma lista que crio para o curso. Isso estimula, principalmente na pós-graduação, o intercâmbio, a troca também entre colegas, a inserção de novos materiais trazidos pelos próprios alunos.
A navegação precisa de bom senso, gosto estético e intuição. Bom senso para não deter-se, diante de tantas possibilidades, em todas elas, sabendo selecionar, em rápidas comparações, as mais importantes. A intuição é um radar que vamos desenvolvendo de "clicar" o mouse nos links que nos levarão mais perto do que procuramos. A intuição nos leva a aprender por tentativa, acerto e erro. Às vezes passaremos bastante tempo sem achar algo importante e, de repente, se estivermos atentos, conseguiremos um artigo fundamental, uma página esclarecedora. O gosto estético nos ajuda a reconhecer e a apreciar páginas elaboradas com cuidado, com bom gosto, com integração de imagem e texto. Principalmente para os alunos, o estético é uma qualidade fundamental de atração. Uma página bem apresentada, com recursos atraentes, é imediatamente selecionada, pesquisada.
Ensinar utilizando a Internet exige uma forte dose de atenção do professor. Diante de tantas possibilidades de busca, a própria navegação se torna mais sedutora do que o necessário trabalho de interpretação. Os alunos tendem a dispersar-se diante de tantas conexões possíveis, de endereços dentro de outros endereços, de imagens e textos que se sucedem ininterruptamente. Tendem a acumular muitos textos, lugares, idéias, que ficam gravados, impressos, anotados. Colocam os dados em seqüência mais do que em confronto. Copiam os endereços, os artigos uns ao lado dos outros, sem a devida triagem.
Creio que isso se deve a uma primeira etapa de deslumbramento diante de tantas possibilidades que a Internet oferece. É mais atraente navegar, descobrir coisas novas do que analisá-las, compará-las, separando o que é essencial do acidental, hierarquizando idéias, assinalando coincidências e divergências. Por outro lado, isso reforça uma atitude consumista dos jovens diante da produção cultural audiovisual. Ver equivale, na cabeça de muitos, a compreender e há um certo ver superficial, rápido, guloso sem o devido tempo de reflexão, de aprofundamento, de cotejamento com outras leituras. Os alunos se impressionam primeiro com as páginas mais bonitas, que exibem mais imagens, animações, sons. As imagens animadas exercem um fascínio semelhante às do cinema, vídeo e televisão. Os lugares menos atraentes visualmente costumam ser deixados em segundo plano, o que acarreta, às vezes, perda de informações de grande valor.
A Internet é uma tecnologia que facilita a motivação dos alunos, pela novidade e pelas possibilidades inesgotáveis de pesquisa que oferece. Essa motivação aumenta se o professor a faz em um clima de confiança, de abertura, de cordialidade com os alunos. Mais que a tecnologia o que facilita o processo de ensino-aprendizagem é a capacidade de comunicação autêntica do professor, de estabelecer relações de confiança com os seus alunos, pelo equilíbrio, competência e simpatia com que atua.
O aluno desenvolve a aprendizagem cooperativa, a pesquisa em grupo, a troca de resultados. A interação bem sucedida aumenta a aprendizagem. Em alguns casos há uma competição excessiva, monopólio de determinados alunos sobre o grupo. Mas, no conjunto, a cooperação prevalece.
A Internet ajuda a desenvolver a intuição, a flexibilidade mental, a adaptação a ritmos diferentes. A intuição, porque as informações vão sendo descobertas por acerto e erro, por conexões "escondidas". As conexões não são lineares, vão "linkando-se" por hipertextos, textos interconectados, mas ocultos, com inúmeras possibilidades diferentes de navegação. Desenvolve a flexibilidade, porque a maior parte das seqüências são imprevisíveis, abertas. A mesma pessoa costuma ter dificuldades em refazer a mesma navegação duas vezes. Ajuda na adaptação a ritmos diferentes: a Internet permite a pesquisa individual, em que cada aluno vai no seu próprio ritmo e a pesquisa em grupo, em que se desenvolve a aprendizagem colaborativa.
Na Internet também desenvolvemos formas novas de comunicação, principalmente escrita. Escrevemos de forma mais aberta, hipertextual, conectada, multilingüística, aproximando texto e imagem. Agora começamos a incorporar sons e imagens em movimento. A possibilidade de divulgar páginas pessoais e grupais na Internet gera uma grande motivação, visibilidade, responsabilidade para professores e alunos. Todos se esforçam por escrever bem, por comunicar melhor as suas idéias, para serem bem aceitos, para "não fazer feio". Alguns dos endereços mais interessantes ou visitados da Internet no Brasil são feitos por adolescentes ou jovens.
Outro resultado comum à maior parte dos projetos na Internet confirma a riqueza de interações que surgem, os contatos virtuais, as amizades, as trocas constantes com outros colegas, tanto por parte de professores como dos alunos. Os contatos virtuais se transformam, quando é possível, em presenciais. A comunicação afetiva, a criação de amigos em diferentes países se transforma em um grande resultado individual e coletivo dos projetos.
Alguns problemas no uso da Internet na educação
Há uma certa confusão entre informação e conhecimento. Temos muitos dados, muitas informações disponíveis. Na informação os dados estão organizados dentro de uma lógica, de um código, de uma estrutura determinada. Conhecer é integrar a informação no nosso referencial, no nosso paradigma, apropriando-a, tornando-a significativa para nós. O conhecimento não se passa, o conhecimento se cria, se constrói.
Alguns alunos não aceitam facilmente essa mudança na forma de ensinar e de aprender. Estão acostumados a receber tudo pronto do professor, e esperam que ele continue "dando aula", como sinônimo de ele falar e os alunos escutarem. Alguns professores também criticam essa nova forma, porque parece uma forma de não dar aula, de ficar "brincando" de aula...
Há facilidade de dispersão. Muitos alunos se perdem no emaranhado de possibilidades de navegação. Não procuram o que está combinado deixando-se arrastar para áreas de interesse pessoal. É fácil perder tempo com informações pouco significativas, ficando na periferia dos assuntos, sem aprofundá-los, sem integrá-los num paradigma consistente. Conhecer se dá ao filtrar, selecionar, comparar, avaliar, sintetizar, contextualizar o que é mais relevante, significativo.
Constato também a impaciência de muitos alunos por mudar de um endereço para outro. Essa impaciência os leva a aprofundar pouco as possibilidades que há em cada página encontrada. Os alunos, principalmente os mais jovens, "passeiam" pelas páginas da Internet, descobrindo muitas coisas interessantes, enquanto deixam por afobação outras tantas, tão ou mais importantes, de lado.
Conclusão
Podemos ensinar e aprender com programas que incluam o melhor da educação presencial com as novas formas de comunicação virtual. Há momentos em que vale a pena encontrar-nos fisicamente,- no começo e no final de um assunto ou de um curso. Há outros em que aprendemos mais estando cada um no seu espaço habitual, mas conectados com os demais colegas e professores, para intercâmbio constante, tornando real o conceito de educação permanente. Ensino a distância não é só um "fast-food" onde o aluno vai lá e se serve de algo pronto. Ensino a distância é ajudar os participantes a que equilibrem as necessidades e habilidades pessoais com a participação em grupos presenciais e virtuais onde avançamos rapidamente, trocamos experiências, dúvidas e resultados.
Tanto nos cursos convencionais como nos a distância teremos que aprender a lidar com a informação e o conhecimento de formas novas, pesquisando muito e comunicando-nos constantemente. Isso nos fará avançar mais rapidamente na compreensão integral dos assuntos específicos, integrando-os num contexto pessoal, emocional e intelectual mais rico e transformador. Assim poderemos aprender a mudar nossas idéias, sentimentos e valores onde se fizer necessário.
É importante sermos professores-educadores com um amadurecimento intelectual, emocional e comunicacional que facilite todo o processo de organização da aprendizagem. Pessoas abertas, sensíveis, humanas, que valorizem mais a busca que o resultado pronto, o estímulo que a repreensão, o apoio que a crítica, capazes de estabelecer formas democráticas de pesquisa e de comunicação.
Necessitamos de muitas pessoas livres nas empresas e escolas que modifiquem as estruturas arcaicas, autoritárias do ensino escolar e gerencial -. Só pessoas livres, autônomas - ou em processo de libertação - podem educar para a liberdade, podem educar para a autonomia, podem transformar a sociedade. Só pessoas livres merecem o diploma de educador.
Faremos com as tecnologias mais avançadas o mesmo que fazemos conosco, com os outros, com a vida. Se somos pessoas abertas, as utilizaremos para comunicar-nos mais, para interagir melhor. Se somos pessoas fechadas, desconfiadas, utilizaremos as tecnologias de forma defensiva, superficial. Se somos pessoas autoritárias, utilizaremos as tecnologias para controlar, para aumentar o nosso poder. O poder de interação não está fundamentalmente nas tecnologias mas nas nossas mentes.
Ensinar com as novas mídias será uma revolução, se mudarmos simultaneamente os paradigmas convencionais do ensino, que mantêm distantes professores e alunos. Caso contrário conseguiremos dar um verniz de modernidade, sem mexer no essencial. A Internet é um novo meio de comunicação, ainda incipiente, mas que pode ajudar-nos a rever, a ampliar e a modificar muitas das formas atuais de ensinar e de aprender.
BIBLIOGRAFIA
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Texto retirado do site: http://www.eca.usp.br/prof/moran/uber.htm
José Manuel Moran
Especialista em projetos inovadores na educação presencial e a distância
Texto que inspirou o capítulo primeiro do livro: MORAN, José Manuel, MASETTO, Marcos e BEHRENS, Marilda. Novas Tecnologias e Mediação Pedagógica. 12ª ed. Campinas: Papirus, 2006, p.11-65
"Um indivíduo consegue hoje um diploma de curso superior sem nunca ter aprendido a comunicar-se, a resolver conflitos, a saber o que fazer com a raiva e outros sentimentos negativos" (Carl Rogers)
Educar é colaborar para que professores e alunos nas escolas e organizações - transformem suas vidas em processos permanentes de aprendizagem. É ajudar os alunos na construção da sua identidade, do seu caminho pessoal e profissional - do seu projeto de vida, no desenvolvimento das habilidades de compreensão, emoção e comunicação que lhes permitam encontrar seus espaços pessoais, sociais e de trabalho e tornar-se cidadãos realizados e produtivos.
Educamos de verdade quando aprendemos com cada coisa, pessoa ou idéia que vemos, ouvimos, sentimos, tocamos, experienciamos, lemos, compartilhamos e sonhamos; quando aprendemos em todos os espaços em que vivemos na família, na escola, no trabalho, no lazer, etc. Educamos aprendendo a integrar em novas sínteses o real e o imaginário; o presente e o passado olhando para o futuro; ciência, arte e técnica; razão e emoção.
De tudo, de qualquer situação, leitura ou pessoa podemos extrair alguma informação, experiência que nos pode ajudar a ampliar o nosso conhecimento, seja para confirmar o que já sabemos, seja para rejeitar determinadas visões de mundo
Na educação - nas organizações empresariais ou escolares - buscamos o equilíbrio entre a flexibilidade (que está ligada ao conceito de liberdade) e a organização (onde há hierarquia, normas, maior rigidez). Com a flexibilidade procuramos adaptar-nos às diferenças individuais, respeitar os diversos ritmos de aprendizagem, integrar as diferenças locais e os contextos culturais. Com a organização, buscamos gerenciar as divergências, os tempos, os conteúdos, os custos, estabelecemos os parâmetros fundamentais. Avançaremos mais se soubermos adaptar os programas previstos às necessidades dos alunos, criando conexões com o cotidiano, com o inesperado, se transformarmos a sala de aula em uma comunidade de investigação.
Ensinar de formas diferentes para pessoas diferentes
Com a Internet estamos começando a ter que modificar a forma de ensinar e aprender tanto nos cursos presenciais como nos de educação continuada, a distância. Só vale a pena estarmos juntos fisicamente - num curso empresarial ou escolar - quando acontece algo significativo, quando aprendemos mais estando juntos do que pesquisando isoladamente nas nossas casas. Muitas formas de ensinar hoje não se justificam mais. Perdemos tempo demais, aprendemos muito pouco, nos desmotivamos continuamente. Tanto professores como alunos temos a clara sensação de que em muitas aulas convencionais perdemos muito tempo.
Podemos modificar a forma de ensinar e de aprender. Um ensinar mais compartilhado. Orientado, coordenado pelo professor, mas com profunda participação dos alunos, individual e grupalmente, onde as tecnologias nos ajudarão muito, principalmente as telemáticas.
Ensinar e aprender exigem hoje muito mais flexibilidade espaço-temporal, pessoal e de grupo, menos conteúdos fixos e processos mais abertos de pesquisa e de comunicação. Uma das dificuldades atuais é conciliar a extensão da informação, a variedade das fontes de acesso, com o aprofundamento da sua compreensão, em espaços menos rígidos, menos engessados. Temos informações demais e dificuldade em escolher quais são significativas para nós e conseguir integrá-las dentro da nossa mente e da nossa vida.
A aquisição da informação, dos dados dependerá cada vez menos do professor. As tecnologias podem trazer hoje dados, imagens, resumos de forma rápida e atraente. O papel do professor - o papel principal - é ajudar o aluno a interpretar esses dados, a relacioná-los, a contextualizá-los.
Aprender depende também do aluno, de que ele esteja pronto, maduro, para incorporar a real significação que essa informação tem para ele, para incorporá-la vivencialmente, emocionalmente. Enquanto a informação não fizer parte do contexto pessoal - intelectual e emocional - não se tornará verdadeiramente significativa, não será aprendida verdadeiramente.
Hoje temos um amplo conhecimento horizontal - sabemos um pouco de muitas coisas, um pouco de tudo. Falta-nos um conhecimento mais profundo, mais rico, mais integrado; o conhecimento diferente, desvendador, mais amplo em todas as dimensões.
Uma parte das nossas dificuldades em ensinar se deve também a mantermos no nível organizacional e interpessoal formas de gerenciamento autoritário, pessoas que não estão acompanhando profundamente as mudanças na educação, que buscam o sucesso imediato, o lucro fácil, o marketing como estratégia principal.
O professor é um facilitador, que procura ajudar a que cada um consiga avançar no processo de aprender. Mas tem os limites do conteúdo programático, do tempo de aula, das normas legais. Ele tem uma grande liberdade concreta, na forma de conseguir organizar o processo de ensino-aprendizagem, mas dentro dos parâmetros básicos previstos socialmente.
O aluno não é unicamente nosso cliente que escolhe o que quer. É um cidadão em desenvolvimento. Há uma interação entre as expectativas dos alunos, as expectativas institucionais e sociais e as possibilidades concretas de cada professor. O professor procura facilitar a fluência, a boa organização e adaptação do curso a cada aluno, mas há limites que todos levarão em consideração. A personalidade do professor é decisiva para o bom êxito do ensino-aprendizagem. Muitos não sabem explorar todas as potencialidades da interação.
Se temos que trabalhar com um grupo, não poderemos provavelmente preencher todas as expectativas individuais. Procuraremos encontrar o ponto de equilíbrio entre as expectativas sociais, as do grupo e as individuais. Quando há uma diferença intransponível entre as expectativas grupais e algumas expectativas individuais, incontornáveis a curto prazo, ainda assim, na educação, procuraremos adaptar flexivelmente as propostas, as técnicas, a avaliação (prazo maior, diferentes formas de avaliação). Somente no fim deste processo podemos julgar negativamente - reprovar o outro. É cômodo para o educador jogar sempre a culpa nos alunos, dizendo que não estão preparados, que são problemáticos. A criatividade está em encontrar formas de aproximação dos alunos às nossas propostas, à nossa pessoa.
Não podemos dar aula da mesma forma para alunos diferentes, para grupos com diferentes motivações. Precisamos adaptar nossa metodologia, nossas técnicas de comunicação a cada grupo. Tem alunos que estão prontos para aprender o que temos a oferecer. É a situação ideal, onde é fácil obter a sua colaboração. Alunos mais maduros, que necessitam daquele curso ou que escolheram aquela matéria livremente facilitam nosso trabalho, nos estimulam, colaboram mais facilmente.
Outros alunos, no início do curso podem estar distantes, mas sabendo chegar até eles, mostrando-nos abertos, confiantes e motivadores, sensibilizando-os para o que eles vão aprender no nosso curso, respondem bem e se dispõem a participar. A partir daí torna-se fácil ensinar.
Existem outros que não estão prontos, que são imaturos ou estão distantes das nossas propostas. Procuraremos aproximá-las o máximo que pudermos deles, partindo do que eles valorizam, do que para eles é importante. Mas se, mesmo assim, a resposta é fria, poderemos apelar para algumas formas de impor tarefas, prazos, avaliações mais freqüentes, de forma madura, mostrando que é pelo bem deles e não como forma de vingança nossa. O professor pode impor sem ser autoritário, sem humilhar, colocando as tarefas de forma clara, calma e justificada. A imposição é um último recurso do professor, não primeiro e único. Sempre que for possível, avançaremos mais pela interação, pela colaboração, pela pesquisa compartilhada do que pela imposição.
Transformar a aula em pesquisa e comunicação
Vejo as aulas nas organizações - como processos contínuos de comunicação e de pesquisa, onde vamos construindo o conhecimento em um equilíbrio entre o individual e o grupal, entre o professor-coordenador-facilitador e os alunos-participantes ativos. Aula-pesquisa, onde professor motiva, incentiva, dá os primeiros passos para sensibilizar o aluno para o valor do que vamos fazer, para a importância da participação do aluno neste processo. Aluno motivado e com participação ativa avança mais, facilita todo o nosso trabalho. Depois da sensibilização - verbal, audiovisual - o aluno - às vezes individualmente e outras em pequenos grupos - procura suas informações, faz a sua pesquisa na Internet, em livros, em contato com experiências significativas, com pessoas ligadas ao tema..
Os grandes temas da matéria são coordenados pelo professor, iniciados pelo professor, motivados pelo professor, mas pesquisados pelos alunos, às vezes todos simultaneamente; às vezes, em grupos; às vezes, individualmente.
Uma parte da pesquisa pode ser feita "ao vivo" (juntos fisicamente); outras, "off line" (cada um pesquisa no seu espaço e tempo preferidos). Ao vivo, o professor está atento às descobertas, às dúvidas, ao intercâmbio das informações (os alunos pesquisam, escolhem, imprimem), ao tratamento das informações. O professor ajuda, problematiza, incentiva, relaciona.
Ao mesmo tempo, o professor coordena as trocas, os alunos relatam suas descobertas, socializam suas dúvidas, mostram os resultados de pesquisa. Se possível, todos recebem uma seleção dos melhores materiais descobertos pelos alunos, junto com os do professor (textos impressos ou colocados a disposição pelo professor ou indicados em sites da Internet).
Os alunos levam para casa os textos, onde aprofundam a sua leitura, fazem novas sínteses, colocam os problemas que os textos suscitam, os relacionam com a sua realidade.
Essa pesquisa é comunicada em classe para os colegas e o professor procura ajudar a contextualizar, a ampliar o universo alcançado pelos alunos, a problematizar, a descobrir novos significados no conjunto das informações trazidas. Esse caminho de ida e volta, onde todos se envolvem, participam é fascinante, criativo, cheio de novidades e de avanços. O conhecimento que é elaborado a partir da própria experiência se torna muito mais forte e definitivo em nós.
Junto com a pesquisa coletiva, o professor incentiva a pesquisa individual ou projetos de grupo. Cada aluno -pessoalmente ou em dupla - escolhe um tema mais específico da matéria e que é do interesse também do aluno. Esse tema é pesquisado pelo aluno com orientação do professor. É apresentado à classe. É distribuído aos colegas. É divulgado na Internet.
É importante neste processo dinâmico de aprender pesquisando, utilizar todos os recursos, todas as técnicas possíveis por cada professor, por cada instituição, por cada classe. Vale a pena descobrir as competências dos alunos que temos em cada classe, que contribuições podem dar ao nosso curso. Não vamos impor um projeto fechado de curso, mas um programa com as grandes diretrizes delineadas e onde vamos construindo caminhos de aprendizagem em cada etapa, estando atentos - professor e alunos - para avançar da forma mais rica possível em cada momento.
Quando vale a pena encontrar-nos na sala de aula?
Iremos combinando daqui em diante cursos presenciais com virtuais, períodos de pesquisa mais individual com outros de pesquisa e comunicação conjunta. Alguns cursos poderemos fazê-los sozinhos com a orientação virtual de um tutor e em outros será importante compartilhar vivências, experiências, idéias.
Quando vale a pena encontrar-nos fisicamente numa sala de aula?
Como regra geral, no começo e no final de um novo tema, de um assunto importante. No início, para colocar esse tema dentro de um contexto maior, para motivar os alunos, para que percebam o que vamos pesquisar e para organizar como vamos pesquisá-lo. Os alunos, iniciados ao novo tema e motivados, o pesquisam, sob a supervisão do professor e voltam a aula depois de um tempo para trazer os resultados da pesquisa, para colocá-los em comum. É o momento final do processo, de trabalhar em cima do que os alunos apresentaram, de complementar, questionar, relacionar o tema com os demais.
Vale a pena encontrar-nos no início de um processo específico de aprendizagem e no final, na hora da troca, da contextualização. Uma parte das aulas pode ser substituída por acompanhamento, monitoramento de pesquisa, onde o professor dá subsídios para os alunos irem além das primeiras descobertas, para ajudá-los nas suas dúvidas. Isso pode ser feito pela Internet, por telefone ou pelo contato pessoal com o professor.
Na medida em que avançam as tecnologias de comunicação virtual, o conceito de presencialidade também se altera. Podemos ter professores externos compartilhando determinadas aulas, um professor de fora "entrando" por videoconferência na minha aula. Haverá um intercâmbio muito maior de professores, onde cada um colabora em algum ponto específico, muitas vezes a distância.
O conceito de curso, de aula também muda. Hoje entendemos por aula um espaço e tempo determinados. Esse tempo e espaço cada vez serão mais flexíveis. O professor continua "dando aula" quando está disponível para receber e responder mensagens dos alunos, quando cria uma lista de discussão e alimenta continuamente os alunos com textos, páginas da Internet, fora do horário específico da sua aula. Há uma possibilidade cada vez mais acentuada de estarmos todos presentes em muitos tempos e espaços diferentes, quando tanto professores quanto os alunos estão motivados e entendem a aula como pesquisa e intercâmbio, supervisionados, animados, incentivados pelo professor.
Poderemos também oferecer cursos predominantemente presenciais e outros predominantemente virtuais. Isso dependerá do tipo de matéria, das necessidades concretas de cobrir falta de profissionais em áreas específicas ou de aproveitar melhor especialistas de outras instituições que seria difícil contratar.
Educar o educador
De um professor espera-se, em primeiro lugar, que seja competente na sua especialidade, que conheça a matéria, que esteja atualizado. Em segundo lugar, que saiba comunicar-se com os seus alunos, motivá-los, explicar o conteúdo, manter o grupo atento, entrosado, cooperativo, produtivo.
Muitos se satisfazem em ser competentes no conteúdo de ensino, em dominar determinada área de conhecimento e em aprimorar-se nas técnicas de comunicação desse conteúdo. São os professores bem preparados, que prestam um serviço importante socialmente em troca de uma remuneração, em geral, mais baixa do que alta.
Na educação, escolar ou empresarial, precisamos de pessoas que sejam competentes em determinadas áreas de conhecimento, em comunicar esse conteúdo aos seus alunos, mas também que saibam interagir de forma mais rica, profunda, vivencial, facilitando a compreensão e a prática de formas autênticas de viver, de sentir, de aprender, de comunicar-se. Ao educar facilitamos, num clima de confiança, interações pessoais e grupais que ultrapassam o conteúdo para, através dele, ajudar a construir um referencial rico de conhecimento, de emoções e de práticas.
As mudanças na educação dependem, em primeiro lugar, de termos educadores maduros intelectual e emocionalmente, pessoas curiosas, entusiasmadas, abertas, que saibam motivar e dialogar. Pessoas com as quais valha a pena entrar em contato, porque dele saímos enriquecidos.
Os grandes educadores atraem não só pelas suas idéias, mas pelo contato pessoal. Dentro ou fora da aula chamam a atenção. Há sempre algo surpreendente, diferente no que dizem, nas relações que estabelecem, na sua forma de olhar, na forma de comunicar-se. São um poço inesgotável de descobertas.
Enquanto isso, boa parte dos professores é previsível, não nos surpreende; repete fórmulas, sínteses.
O contato com educadores entusiasmados atrai, contagia, estimula, os torna próximos da maior parte dos alunos. Mesmo que não concordemos com todas as suas idéias, os respeitamos.
As primeiras reações que o bom professor e educador despertam no aluno são a confiança, a admiração e o entusiasmo. Isso facilita enormemente o processo de ensino-aprendizagem.
As mudanças na educação dependem também de termos administradores, diretores e coordenadores mais abertos, que entendam todas as dimensões que estão envolvidas no processo pedagógico, além das empresariais ligadas ao lucro; que apoiem os professores inovadores, que equilibrem o gerenciamento empresarial, tecnológico e o humano, contribuindo para que haja um ambiente de maior inovação, intercâmbio e comunicação.
As mudanças na educação dependem também dos alunos. Alunos curiosos, motivados, facilitam enormemente o processo, estimulam as melhores qualidades do professor, tornam-se interlocutores lúcidos e parceiros de caminhada do professor-educador.
Alunos motivados aprendem e ensinam, avançam mais, ajudam o professor a ajudá-los melhor. Alunos que provêm de famílias abertas, que apóiam as mudanças, que estimulam afetivamente os filhos, que desenvolvem ambientes culturalmente ricos, aprendem mais rapidamente, crescem mais confiantes e se tornam pessoas mais produtivas.
Educação para a autonomia e para a cooperação
A educação avança pouco - nas organizações empresariais e nas escolas - porque ainda estamos profundamente inseridos em organizações autoritárias, em processos de ensino e aprendizagem controladores, com educadores pouco livres, mal resolvidos, que repetem mais do que pesquisam, que impõem mais do que se comunicam, que não acreditam no seu próprio potencial nem no dos seus alunos, que desconhecem o quanto eles e seus alunos podem realizar!.
Um dos eixos das mudanças na educação passa pela transformação da educação em um processo de comunicação autêntica, aberta entre professores e alunos, principalmente, mas também incluindo administradores e a comunidade (todos os envolvidos no processo organizacional). Só vale a pena ser educador dentro de um contexto comunicacional participativo, interativo, vivencial. Só aprendemos profundamente dentro deste contexto. Não vale a pena ensinar dentro de estruturas autoritárias e ensinar de forma autoritária. Pode até ser mais eficiente a curto prazo - os alunos aprendem rapidamente determinados conteúdos programáticos - mas não aprendem a ser pessoas, a ser cidadãos.
Sei que parece uma ingenuidade falar de comunicação autêntica numa sociedade altamente competitiva, onde cada um se expõe até determinado ponto e, na maior parte das vezes, se esconde, em processos de comunicação aparentes, cheios de desconfiança, quando não de interações destrutivas. As organizações que quiserem evoluir terão que aprender a reeducar-se em ambientes mais significativos de confiança, de cooperação, de autenticidade. Isso as fará crescer mais, estar mais atentas às mudanças necessárias.
Com ou sem tecnologias avançadas podemos vivenciar processos participativos de compartilhamento de ensinar e aprender (poder distribuído) através da comunicação mais aberta, confiante, de motivação constante, de integração de todas as possibilidades da aula-pesquisa/aula-comunicação, num processo dinâmico e amplo de informação inovadora, reelaborada pessoalmente e em grupo, de integração do objeto de estudo em todas as dimensões pessoais: cognitivas, emotivas, sociais, éticas e utilizando todas as habilidades disponíveis do professor e do aluno.
É importante educar para a autonomia, para que cada um encontre o seu próprio ritmo de aprendizagem e, ao mesmo tempo, é importante educar para a cooperação, para aprender em grupo, para intercambiar idéias, participar de projetos, realizar pesquisas em conjunto.
Só podemos educar para a autonomia, para a liberdade com autonomia e liberdade. Uma das tarefas mais urgentes é educar o educador para uma nova relação no processo de ensinar e aprender, mais aberta, participativa, respeitosa do ritmo da cada aluno, das habilidades específicas de cada um.
O caminho para a autonomia acontece combinando equilibradamente a interação e a interiorização. Pela interação aprendemos, nos expressamos, confrontamos nossas experiências, idéias, realizações; pela interação buscamos ser aceitos, acolhidos pela sociedade, pelos colegas, por alguns grupos significativos. Pela interiorização fazemos a integração de tudo, das idéias, interações, realizações em nós, vamos encontrando nossa síntese, nossa identidade, nossa marca pessoal, nossa diferença.
A tecnologia nos propicia interações mais amplas, que combinam o presencial e o virtual. Somos solicitados continuamente a voltar-nos para fora, a distrair-nos, a copiar modelos externos, o que dificulta o processo de interiorização, de personalização. O educador precisa estar atento para utilizar a tecnologia como integração e não como distração ou fuga.
O educador autêntico é humilde e confiante. Mostra o que sabe e, ao mesmo tempo está atento ao que não sabe, ao novo. Mostra para o aluno a complexidade do aprender, a sua ignorância, suas dificuldades. Ensina, aprendendo a relativizar, a valorizar a diferença, a aceitar o provisório. Aprender é passar da incerteza a uma certeza provisória que dá lugar a novas descobertas e a novas sínteses.
Experiências pessoais de ensino utilizando a Internet
Venho desenvolvendo algumas experiências no ensino de graduação e de pós-graduação na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Criei uma página pessoal na Internet, no endereço www.eca.usp.br/prof/moran. Nela constam as disciplinas de pós-graduação - Redes eletrônicas na Educação e Novas Tecnologias para uma Nova Educação - e três de graduação - Novas Fronteiras da Televisão, Legislação e Ética do Radialismo e Mercadologia de Rádio e Televisão - com o programa e alguns textos meus e dos meus alunos. O roteiro básico é o seguinte: no começo do semestre, cada aluno escolhe um assunto específico dentro da matéria, vai pesquisando-o na Internet e na biblioteca. Ao mesmo tempo, pesquisamos também temas básicos do curso. O aluno apresenta os resultados da sua pesquisa específica na classe e depois pode divulgá-los, se quiser, através da Internet.
Disponho de duas salas de aula com dez computadores em uma e quatorze em outra, ligados à Internet por fibra ótica, para vinte alunos, em média. Utilizamos essa sala a cada duas ou três semanas. As outras aulas acontecem na sala convencional.
O fato de ver o seu nome na Internet e a possibilidade de divulgar os seus trabalhos e pesquisas, exerce uma forte motivação nos alunos, os estimula a participar mais em todas as atividades do curso. Enquanto preparam os trabalhos pessoais, vou desenvolvendo com eles algumas atividades.
Começamos com uma aula introdutória para os que não estão familiarizados com a Internet. Nela aprendemos a conhecer e a usar as principais ferramentas. Fazemos pesquisa livre, em vários programas de busca. Cadastramos a cada aluno para que tenha o seu e mail pessoal (na própria universidade ou em sites que oferecem endereços eletrônicos gratuitamente).
Num segundo momento, todos pesquisamos um tópico importante do programa. É importante sensibilizar o aluno antes para o que se quer conseguir neste momento, neste tópico. Se o aluno tem claro ou encontra valor no que vai pesquisar, o fará com mais rapidez e eficiência. O professor precisa estar atento, porque a tendência na Internet é para a dispersão fácil. O intercâmbio constante de resultados, a supervisão do professor podem ajudar a obter melhores resultados. Eles vão gravando os endereços, artigos e imagens mais interessantes em disquete e também fazem anotações escritas, com rápidos comentários sobre o que estão salvando. As descobertas mais importantes são comunicadas aos colegas. Imprimem os textos mais significativos. No final, os alunos comunicam os principais resultados da sua busca e encontramos os principais pontos de apoio para analisar o tema do dia. Professor e alunos relacionam as coincidências e divergências entre os resultados encontrados e as informações já conhecidas em reflexões anteriores, em livros e revistas.
O meu papel é o de acompanhar cada aluno, incentivá-lo, resolver suas dúvidas, divulgar as melhores descobertas. As aulas na Internet se alternam com as aulas habituais, onde acrescentamos textos escritos, vídeos para aprofundar os temas pesquisados inicialmente na Internet. Posteriormente, cada aluno desenvolve um tema específico de pesquisa, que ele escolhe, conciliando o seu interesse pessoal e o da matéria. É interessante que os alunos escolham algum assunto dentro do programa que esteja mais próximo do que eles valorizam mais. Essas pesquisas podem ser realizadas dentro e fora do período de aula. Estou junto com eles, dando dicas, tirando dúvidas, anotando descobertas. Esses temas específicos são mais tarde apresentados em classe para os colegas. O professor complementa, questiona, relaciona essas apresentações com a matéria como um todo. Alguns alunos criam suas páginas pessoais e outros entregam somente os resultados das suas pesquisas para colocá-los na minha página.
Além das aulas, acontece um estimulante processo de comunicação virtual, junto com o presencial. Eles podem pesquisar em uma sala especial em qualquer horário, se houver máquinas livres. Os alunos me procuram mais para atendimento específico na minha sala, e também enviam mensagens eletrônicas. Como todos têm e-mail, envio com freqüência textos, endereços, idéias, sugestões em uma lista que crio para o curso. Isso estimula, principalmente na pós-graduação, o intercâmbio, a troca também entre colegas, a inserção de novos materiais trazidos pelos próprios alunos.
A navegação precisa de bom senso, gosto estético e intuição. Bom senso para não deter-se, diante de tantas possibilidades, em todas elas, sabendo selecionar, em rápidas comparações, as mais importantes. A intuição é um radar que vamos desenvolvendo de "clicar" o mouse nos links que nos levarão mais perto do que procuramos. A intuição nos leva a aprender por tentativa, acerto e erro. Às vezes passaremos bastante tempo sem achar algo importante e, de repente, se estivermos atentos, conseguiremos um artigo fundamental, uma página esclarecedora. O gosto estético nos ajuda a reconhecer e a apreciar páginas elaboradas com cuidado, com bom gosto, com integração de imagem e texto. Principalmente para os alunos, o estético é uma qualidade fundamental de atração. Uma página bem apresentada, com recursos atraentes, é imediatamente selecionada, pesquisada.
Ensinar utilizando a Internet exige uma forte dose de atenção do professor. Diante de tantas possibilidades de busca, a própria navegação se torna mais sedutora do que o necessário trabalho de interpretação. Os alunos tendem a dispersar-se diante de tantas conexões possíveis, de endereços dentro de outros endereços, de imagens e textos que se sucedem ininterruptamente. Tendem a acumular muitos textos, lugares, idéias, que ficam gravados, impressos, anotados. Colocam os dados em seqüência mais do que em confronto. Copiam os endereços, os artigos uns ao lado dos outros, sem a devida triagem.
Creio que isso se deve a uma primeira etapa de deslumbramento diante de tantas possibilidades que a Internet oferece. É mais atraente navegar, descobrir coisas novas do que analisá-las, compará-las, separando o que é essencial do acidental, hierarquizando idéias, assinalando coincidências e divergências. Por outro lado, isso reforça uma atitude consumista dos jovens diante da produção cultural audiovisual. Ver equivale, na cabeça de muitos, a compreender e há um certo ver superficial, rápido, guloso sem o devido tempo de reflexão, de aprofundamento, de cotejamento com outras leituras. Os alunos se impressionam primeiro com as páginas mais bonitas, que exibem mais imagens, animações, sons. As imagens animadas exercem um fascínio semelhante às do cinema, vídeo e televisão. Os lugares menos atraentes visualmente costumam ser deixados em segundo plano, o que acarreta, às vezes, perda de informações de grande valor.
A Internet é uma tecnologia que facilita a motivação dos alunos, pela novidade e pelas possibilidades inesgotáveis de pesquisa que oferece. Essa motivação aumenta se o professor a faz em um clima de confiança, de abertura, de cordialidade com os alunos. Mais que a tecnologia o que facilita o processo de ensino-aprendizagem é a capacidade de comunicação autêntica do professor, de estabelecer relações de confiança com os seus alunos, pelo equilíbrio, competência e simpatia com que atua.
O aluno desenvolve a aprendizagem cooperativa, a pesquisa em grupo, a troca de resultados. A interação bem sucedida aumenta a aprendizagem. Em alguns casos há uma competição excessiva, monopólio de determinados alunos sobre o grupo. Mas, no conjunto, a cooperação prevalece.
A Internet ajuda a desenvolver a intuição, a flexibilidade mental, a adaptação a ritmos diferentes. A intuição, porque as informações vão sendo descobertas por acerto e erro, por conexões "escondidas". As conexões não são lineares, vão "linkando-se" por hipertextos, textos interconectados, mas ocultos, com inúmeras possibilidades diferentes de navegação. Desenvolve a flexibilidade, porque a maior parte das seqüências são imprevisíveis, abertas. A mesma pessoa costuma ter dificuldades em refazer a mesma navegação duas vezes. Ajuda na adaptação a ritmos diferentes: a Internet permite a pesquisa individual, em que cada aluno vai no seu próprio ritmo e a pesquisa em grupo, em que se desenvolve a aprendizagem colaborativa.
Na Internet também desenvolvemos formas novas de comunicação, principalmente escrita. Escrevemos de forma mais aberta, hipertextual, conectada, multilingüística, aproximando texto e imagem. Agora começamos a incorporar sons e imagens em movimento. A possibilidade de divulgar páginas pessoais e grupais na Internet gera uma grande motivação, visibilidade, responsabilidade para professores e alunos. Todos se esforçam por escrever bem, por comunicar melhor as suas idéias, para serem bem aceitos, para "não fazer feio". Alguns dos endereços mais interessantes ou visitados da Internet no Brasil são feitos por adolescentes ou jovens.
Outro resultado comum à maior parte dos projetos na Internet confirma a riqueza de interações que surgem, os contatos virtuais, as amizades, as trocas constantes com outros colegas, tanto por parte de professores como dos alunos. Os contatos virtuais se transformam, quando é possível, em presenciais. A comunicação afetiva, a criação de amigos em diferentes países se transforma em um grande resultado individual e coletivo dos projetos.
Alguns problemas no uso da Internet na educação
Há uma certa confusão entre informação e conhecimento. Temos muitos dados, muitas informações disponíveis. Na informação os dados estão organizados dentro de uma lógica, de um código, de uma estrutura determinada. Conhecer é integrar a informação no nosso referencial, no nosso paradigma, apropriando-a, tornando-a significativa para nós. O conhecimento não se passa, o conhecimento se cria, se constrói.
Alguns alunos não aceitam facilmente essa mudança na forma de ensinar e de aprender. Estão acostumados a receber tudo pronto do professor, e esperam que ele continue "dando aula", como sinônimo de ele falar e os alunos escutarem. Alguns professores também criticam essa nova forma, porque parece uma forma de não dar aula, de ficar "brincando" de aula...
Há facilidade de dispersão. Muitos alunos se perdem no emaranhado de possibilidades de navegação. Não procuram o que está combinado deixando-se arrastar para áreas de interesse pessoal. É fácil perder tempo com informações pouco significativas, ficando na periferia dos assuntos, sem aprofundá-los, sem integrá-los num paradigma consistente. Conhecer se dá ao filtrar, selecionar, comparar, avaliar, sintetizar, contextualizar o que é mais relevante, significativo.
Constato também a impaciência de muitos alunos por mudar de um endereço para outro. Essa impaciência os leva a aprofundar pouco as possibilidades que há em cada página encontrada. Os alunos, principalmente os mais jovens, "passeiam" pelas páginas da Internet, descobrindo muitas coisas interessantes, enquanto deixam por afobação outras tantas, tão ou mais importantes, de lado.
Conclusão
Podemos ensinar e aprender com programas que incluam o melhor da educação presencial com as novas formas de comunicação virtual. Há momentos em que vale a pena encontrar-nos fisicamente,- no começo e no final de um assunto ou de um curso. Há outros em que aprendemos mais estando cada um no seu espaço habitual, mas conectados com os demais colegas e professores, para intercâmbio constante, tornando real o conceito de educação permanente. Ensino a distância não é só um "fast-food" onde o aluno vai lá e se serve de algo pronto. Ensino a distância é ajudar os participantes a que equilibrem as necessidades e habilidades pessoais com a participação em grupos presenciais e virtuais onde avançamos rapidamente, trocamos experiências, dúvidas e resultados.
Tanto nos cursos convencionais como nos a distância teremos que aprender a lidar com a informação e o conhecimento de formas novas, pesquisando muito e comunicando-nos constantemente. Isso nos fará avançar mais rapidamente na compreensão integral dos assuntos específicos, integrando-os num contexto pessoal, emocional e intelectual mais rico e transformador. Assim poderemos aprender a mudar nossas idéias, sentimentos e valores onde se fizer necessário.
É importante sermos professores-educadores com um amadurecimento intelectual, emocional e comunicacional que facilite todo o processo de organização da aprendizagem. Pessoas abertas, sensíveis, humanas, que valorizem mais a busca que o resultado pronto, o estímulo que a repreensão, o apoio que a crítica, capazes de estabelecer formas democráticas de pesquisa e de comunicação.
Necessitamos de muitas pessoas livres nas empresas e escolas que modifiquem as estruturas arcaicas, autoritárias do ensino escolar e gerencial -. Só pessoas livres, autônomas - ou em processo de libertação - podem educar para a liberdade, podem educar para a autonomia, podem transformar a sociedade. Só pessoas livres merecem o diploma de educador.
Faremos com as tecnologias mais avançadas o mesmo que fazemos conosco, com os outros, com a vida. Se somos pessoas abertas, as utilizaremos para comunicar-nos mais, para interagir melhor. Se somos pessoas fechadas, desconfiadas, utilizaremos as tecnologias de forma defensiva, superficial. Se somos pessoas autoritárias, utilizaremos as tecnologias para controlar, para aumentar o nosso poder. O poder de interação não está fundamentalmente nas tecnologias mas nas nossas mentes.
Ensinar com as novas mídias será uma revolução, se mudarmos simultaneamente os paradigmas convencionais do ensino, que mantêm distantes professores e alunos. Caso contrário conseguiremos dar um verniz de modernidade, sem mexer no essencial. A Internet é um novo meio de comunicação, ainda incipiente, mas que pode ajudar-nos a rever, a ampliar e a modificar muitas das formas atuais de ensinar e de aprender.
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Texto retirado do site: http://www.eca.usp.br/prof/moran/uber.htm
José Manuel Moran
Especialista em projetos inovadores na educação presencial e a distância
Texto que inspirou o capítulo primeiro do livro: MORAN, José Manuel, MASETTO, Marcos e BEHRENS, Marilda. Novas Tecnologias e Mediação Pedagógica. 12ª ed. Campinas: Papirus, 2006, p.11-65
Tecnologia e formação de professores: Rumo a uma pedagogia pós-moderna?
ARTIGO RETIRADO DO SITE: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73301998000400005&tlng=en&lng=en&nrm=iso Acesso: 21092007 às 08:14.
Educação& Sociedade
Print ISSN 0101-7330
Educ. Soc. vol. 19 n. 65 Campinas Dec. 1998
Tecnologia e formação de professores: Rumo a uma pedagogia pós-moderna?
Maria Luiza Belloni*
RESUMO: A partir da discussão dos controvertidos conceitos de modernidade e pós-modernidade, este texto busca destacar os ideais e as conquistas da sociedade moderna em dois campos cada vez mais complementares no processo de socialização das novas gerações: a educação e a comunicação. Considerando a crescente importância do fenômeno comunicacional na sociedade atual, globalizada e tecnificada, a educação é chamada a constituir-se em espaço de mediação entre a criança e um meio ambiente povoado de máquinas cada vez mais "inteligentes". Tendo como eixo teórico a integração - necessária e inelutável - ao campo educacional, das novas tecnologias de comunicação e de informatização, a autora tenta delinear alguns caminhos para a formação de professores numa perspectiva inovadora, indispensável para a melhoria da qualidade da escola do presente e do futuro.
Palavras-chave: Formação de professores, tecnologia e educação, comunicação educacional, pós-modernidade, inovação pedagógica
Modernidade radical
Analisando correntes/teorias/movimentos ditos pós-modernos, Giddens parte da compreensão da natureza da própria modernidade, para concluir que o que chamamos "pós moderno" corresponde a um período em que "as conseqüências da modernidade estão se tornando mais radicalizadas e universalizadas do que antes" (1991a, p. 13).
Para compreender como seria (ou deveria ser) a escola que corresponde a essa modernidade radical - e principalmente para compreender as relações entre educação e comunicação -, proponho ir buscar, nas raízes do projeto humanista da modernidade, a significação das duas maiores conquistas do homem moderno: o direito à educação (universal, igualitária, democrática) e o direito à comunicação (livre e plural).
Quando os filósofos iluministas pregavam os ideais da modernidade contra o antigo regime, uma revolução política já estava a caminho, no bojo da transformação econômica: um novo modo de produção e de apropriação da riqueza social se instalava na Europa Ocidental. O Estado democrático moderno, baseado no indivíduo emancipado (nem nobre nem servo) e moralmente autônomo, expressa e consolida novas lealdades, novos sistemas de legitimação política, mais adequados ao capitalismo emergente.
Um dos mais importantes ideais da modernidade é, sem dúvida, a igualdade civil entre todos os indivíduos dotados de razão, agora transformados em trabalhadores livres e cidadãos autônomos. Este era um ideal a construir, a conquistar: a emancipação política e a autonomia moral, que fazem de qualquer homem um indivíduo livre e um cidadão, precisavam ser cultivadas e difundidas para atingir a todos através da educação e da comunicação.
O direito à educação deveria ser universalizado atingindo a todas as crianças que deveriam ser alfabetizadas para ler os textos (sagrados e profanos) e ser treinadas para conhecer os saberes e as técnicas desenvolvidas pela humanidade.
O direito à comunicação corresponde à criação de um novo espaço público de discussão livre e "pública" (no sentido de transparente), identificado com o direito de expressão das opiniões do cidadão emancipado e esclarecido e com o dever de exigir a "publicização" (transparência) dos negócios do Estado (Belloni 1995b).
A universalização da educação, realizada pela escola pública e laica, é um projeto iluminista como o é a livre expressão de idéias, consagrada na imprensa livre e independente. Do mesmo modo, a sociedade moderna é um "projeto de saber".
O projeto humanista da modernidade acreditava no progresso infinito da humanidade, baseado na Razão e no Saber, apontando para a utopia da igualdade natural dos homens: aquela dada pela racionalidade. Deus ainda estava vivo, mas já não era tão necessário. O racionalismo (incluindo o direito natural) surgia como novo paradigma.
Uma nova ética - protestante - adequada ao espírito dos novos tempos - capitalista - estabelecia uma relação direta entre Deus e o indivíduo moralmente autônomo, dotado de razão capaz de ler e compreender a palavra sagrada e fazer sua escolha entre o bem e o mal, dispensando a intermediação do clero católico, os comunicadores do antigo regime. A nova ética de cidadãos livres e indivíduos autônomos não admite mais a interferência na privacidade (identificada com a família e o lar) representada pela exigência católica da confissão, por exemplo.
A modernidade corresponde, pois, a uma certa racionalidade (que os pensadores de Frankfurt qualificam como instrumental), a um desencantamento do mundo (que Weber afirma inelutável), e ao progresso espantoso das ciências experimentais e dos avanços tecnológicos. Tudo isso em conexão com uma organização racionalista da sociedade que culminaria com empresas eficientes e aparelhos estatais bem organizados (Canclini 1989, p. 22).
A modernidade pode também ser entendida como um "processo civilizatório". Muito mais ampla que um modo de produção, ela significa um novo paradigma, uma nova racionalidade, uma promessa de sociedade baseada em dois pilares potencialmente contraditórios: a regulação (constituída pelos princípios do Estado, do mercado e da comunidade) e a emancipação (com três lógicas de racionalidade: estética, moral e técnica) (Santos 1994, p. 31).
Pela sua complexidade interna, pela riqueza e diversidade das idéias novas que comporta e pela maneira como procura a articulação entre elas, o projeto da modernidade é um projeto ambicioso e revolucionário. As suas possibilidades são infinitas, mas por o serem, contemplam tanto o excesso das promessas como o déficit do seu cumprimento.(...) O excesso reside no próprio objetivo de vincular o pilar da regulação ao pilar da emancipação e de os vincular a ambos à concretização de objetivos práticos de racionalização global da vida coletiva e da vida individual. (idem, p. 71)
As promessas cumpridas em excesso revelam-se nas muitas formas do imenso progresso da ciência e da tecnologia e suas infinitas possibilidades de aplicação no mercado. Por outro lado, na esteira desse progresso, as promessas de emancipação acabaram se transformando no "lado cultural da regulação", um processo bem caracterizado por Gramsci com o conceito de hegemonia (ib., p. 78).
Na utopia iluminista, a educação desempenhava um papel social de grande importância, inédito na história da humanidade: coerente com a crença no progresso baseado no saber, o projeto da modernidade atribui à escola a função de socializar as novas gerações, formando os futuros cidadãos respeitadores das instituições sociais e do Estado. A educação moral e cívica deve formar igualmente o trabalhador e a elite, iguais na cidadania, porém cada grupo em sua função, todos contribuindo para o progresso da sociedade. A escola ganha status de instituição oficial, pública, mantida pelo Estado, tendo como principais características sua independência religiosa (laica e científica) e seu caráter universal (igual para todos). É a escola da cidadania.
Na prática, na passagem pelo século XIX da Revolução Industrial e do positivismo, a escola moderna evoluiu do ideal revolucionário de emancipação à consolidação de uma instituição eficiente na reprodução das desigualdades sociais (Bourdieu e Passeron 1970). Sem nunca deixar de ser um espaço de luta entre diferentes grupos sociais, a instituição escolar vai perdendo seu potencial emancipador, para ir se transformando em mecanismo eficaz de regulação.
Também no campo da comunicação, um novo agente social foi se formando: a opinião pública e seu porta-voz, a imprensa. O espaço público moderno vai se constituindo como locus de discussão livre sobre as regras da sociedade civil e do Estado: ali se discutem livremente as cotações do mercado, as novidades literárias e os abusos do poder político. A imprensa, a mídia da época tornada possível graças a um invento revolucionário (a prensa tipográfica de Gutemberg), vai desempenhar um papel extremamente importante nesse processo de formação do cidadão autônomo. Da mesma forma que no Nordeste de Paulo Freire nos anos 60, no século XVIII europeu saber ler era condição sine qua non da cidadania. No Terceiro Milênio, da cultura cibernética e da realidade virtual, ser cidadão exige saber digitar, até mesmo literalmente, na urna eletrônica.
A escola moderna, formadora do cidadão emancipado e autônomo, nascia sob o signo da palavra impressa que tinha uma conotação democrática e subversiva. A escola da pós-modernidade, do futuro, terá que formar o cidadão capaz de "ler e escrever" em todas as novas linguagens do universo informacional em que ele está imerso.
... ou pós-modernidade?
Ao fim do século XX, no limiar do novo milênio, 200 anos depois da Revolução Francesa, aqueles ideais do Iluminismo (sobretudo quando vistos desde o hemisfério sul) parecem ter-se "desmanchado no ar" sem nunca terem sido realmente "sólidos" (Berman 1988).
Aos ideais universais e às grandes teorias sociais opõem-se agora valores heteróclitos e narrativas fragmentadas; o espaço público dos salões e dos cafés burgueses é substituído pelo simulacro espetacular repetido incessantemente pelas diferentes mídias. Ao público esclarecido se opõe a massa indiferenciada de consumidores, agora em escala planetária.
Os grandes movimentos intelectuais e políticos (Iluminismo, liberalismo, positivismo, socialismo) são agora relegados ao plano de simples "metarrelatos" (ou metanarrativas) intrinsecamente diferentes entre si, porém com a qualidade comum de não terem mais nenhuma hegemonia. A proclamação do fim da história faz parte dessa retórica, como uma expressão do neoliberalismo radical, que apresenta seu modelo de mercado global para todos, para sempre, como o ponto de chegada do projeto iluminista.
No universo fragmentado da cidade pós-moderna, todas as narrativas se equivalem; não há valores universais que embasariam um consenso qualquer: o relativismo culturalista aponta para a fragmentação infinita que acaba por uniformizar tudo na lógica da mercadoria.
A escola é agora apenas mais uma entre as muitas agências especializadas na produção e na disseminação da cultura. Em concorrência com as diferentes mídias, a escola tende a perder terreno e prestígio no processo mais geral de transmissão da cultura e particularmente no processo de socialização das novas gerações, que é sua função específica. Num mundo cada vez mais "aberto" e povoado de máquinas que lidam com o saber e com o imaginário, a escola apega-se ainda aos espaços e tempos "fechados" do prédio, da sala de aula, do livro didático, dos conteúdos curriculares extensivos, defendendo-se da inovação.
No campo da comunicação, duas tendências aparentemente contraditórias delineiam-se claramente: de um lado, uma extrema concentração da produção globalizada de bens culturais com base na publicidade; de outro, uma fragmentação cada vez mais acentuada de textos, máquinas, meios, mitos, linguagens e públicos que se mesclam, se adaptam e transformam as diversidades culturais.
A pós-modernidade é algo fugidio, difícil de cernir. Podemos considerar a pós-modernidade como uma certa "dominante cultural", típica do capitalismo tardio, disseminada por todo o planeta (Jameson); ou como "novo paradigma" do conhecimento e o fim dos "metarrelatos" (Lyotard); ou ainda simplesmente como um "estilo" cultural, compreendendo aspectos estéticos e de consumo. Em qualquer dessas abordagens estão presentes as idéias de fragmentação, simulacro (ou pastiche), de multiplicidade (Yudice 1995).
Habermas considera, no entanto, que o que se convencionou chamar pós-modernidade é um impasse político-cultural (ou uma transição difícil) na realização do projeto emancipador, ainda incompleto, da modernidade, que tem como força propulsora uma nova "racionalidade comunicativa democratizadora", que se sobreporá à racionalidade instrumental (idem, p.79).
Já para Boaventura de Souza Santos, "o projeto não pode ser concluído em termos modernos sob pena de nos mantermos prisioneiros da mega-armadilha que a modernidade nos preparou: a transformação incessante das energias emancipatórias em energias regulatórias" (Santos 1994, p. 84).
Nesse contexto de imprecisão e insegurança conceitual, a questão fundamental para compreender o papel da educação na pós-modernidade continua posta e ganha novo significado: pode-se esperar que a cultura (incluindo educação e comunicação) tenha ainda um potencial emancipador? Ou a pós-modernidade constitui mais um metarrelato de caráter conformista, a legitimar um capitalismo globalizado, "tardio" e perverso? Uma versão estético-expressiva do "cada-um-por-si" do neoliberalismo?
Essa nova cultura "pós-moderna" constitui o estilo de vida próprio do capitalismo contemporâneo e toma formas diferentes segundo as socioculturas. Embora disseminado por todo o mundo dito "civilizado", isto é, atingível pela televisão via satélite, o estilo pós-moderno apresenta uma diversidade enorme de facetas que espelham as realidades locais. Nos Estados Unidos, por exemplo, a proposta pós-moderna gerou um discurso ideológico e um movimento social que tomaram uma forma um tanto puritana, típica da cultura americana racionalizada, pragmática e individualista: o multiculturalismo politicamente correto.
Já na América Latina, no Brasil e no México, por exemplo, temos culturas híbridas, nas quais coexistem, adaptam-se e transformam-se muitos elementos da modernidade, sentimentos e lealdades pré-modernos e situações comunicacionais de alta tecnicidade e de caráter "pós-moderno" (Canclini 1989).
Nessas culturas híbridas, nas quais o moderno se integra com o pré e o pós-moderno, o "realismo mágico", por exemplo, é um realismo tout court, a realidade é que é mágica, absurda do ponto de vista da racionalidade ocidental que define o paradigma dominante do conhecimento. Nessas culturas híbridas, as narrativas antigas e arquetípicas adaptam-se às linguagens audiovisuais e aos estilos pós-modernos, configurando mensagens que nada mais têm a ver com os mitos originais de que são referências, senão seu poder de persuasão: assim as novelas, os folhetins diversos, a música, o cinema. Os limites entre a cultura erudita e a popular foram confundidos pela cultura de massa, onde tudo se mistura, se fragmenta e se repete como numa sala de espelhos.
O caráter heterogêneo das sociedades latino-americanas fez surgirem "formas descontínuas, alternativas e híbridas que desafiaram a hegemonia do grande relato da modernidade", caracterizando uma espécie de pós-modernidade avant la lettre (Yudice 1995, p. 64).
Há, porém, uma característica comum a todas essas mensagens fragmentadas e sem coerência: justamente o espelho - os sistemas de mídia que multiplicam ao infinito qualquer mensagem (obra de arte erudita, manifestação popular ou informação), esvaziando-a de seu significado específico e privando-a de sua autenticidade, ao transformá-la em produto midiático, subordinado à lógica da produção globalizada. Um dos fenômenos mais interessantes quanto a essas culturas híbridas, de que nos fala Canclini, é a importância, para sua constituição, do avanço incrível das técnicas de comunicação radicalizando os conceitos modernos de tempo e de espaço, mesclando o rural e o urbano, redimensionando os modos de ser e de apreender o mundo, transformando a humanidade e o indivíduo.
Cabe lembrar que a distância entre espaço e tempo é típica da modernidade, sendo seu emblema o relógio mecânico, a máquina moderna que permitiu separar o tempo (tornado abstrato) e o lugar (que até então era a referência para o tempo). A invenção do relógio foi fundamental para o cálculo do valor do trabalho industrial assalariado, como todos sabemos, que assim se autonomiza (separa) do ciclo natural do tempo, válido na agricultura (Giddens 1991a, p. 25). As redes informáticas e os satélites de comunicação estão operando mais um redimensionamento de nossas noções de tempo e de espaço. Outros autores, trabalhando no campo do ensino a distância e inspirados em Giddens, consideram que a globalização representa uma "nova consciência mundial trazida pela compressão do tempo e do espaço", o que teria profundas implicações para o ensino a distância, concebido em termos mundiais (Stevens 1996 e Edwards 1994).
Nesse quadro de incertezas, neste fim de século cheio de riscos (Giddens 1991a e 1991b) e de redefinições, atribuir ao estilo cultural pós-moderno um caráter emancipatório (como a ilusão multiculturalista) parece-nos otimismo ingênuo, pois esquece que a base econômica ainda é capitalista e sua ideologia neoliberal ainda mantém a hegemonia em quase todo o planeta. Parece difícil saber, hoje, se as culturas híbridas dos países periféricos (frutos do casamento de conveniência entre as culturas populares locais e os sistemas de mídia) encerram um potencial emancipador, configurando uma "pós-modernidade de resistência" (Santos 1994, p. 91), ou se o discurso pós-moderno consolida a hegemonia de uma cultura mundializada que tende a mascarar a importância do avanço tecnológico para o aprofundamento das desigualdades sociais e regionais.
A mídia, que no século XVIII surgiu como um instrumento de emancipação, tornou-se, no século XX, um meio eficiente de dominação e controle social, em que pese a fragmentação pós-moderna de mensagens e públicos. Seu uso emancipatório é eventual e episódico. Embora seja importante ressaltar que a "explosão da realidade midiática e informacional torna possível uma competência democrática mais alargada" (Santos, id., p. 83), a eficácia política e social dessa competência resta a ser determinada.
Quanto à educação, teorias baseadas em modelos inspirados no "paradigma fordista", dominante no mundo capitalista desde as primeiras décadas do século XX, tiveram grande impacto sobre políticas e práticas educacionais, principalmente no período após a Segunda Guerra Mundial. É importante lembrar que, nesse período, a oferta de serviços públicos pelo Estado cresceu muito e se organizou segunda a lógica fordista (Campion e Renner 1992). O crescimento da demanda de educação pública, especialmente de 1º e 2º graus, criou as condições que estimulam e legitimam concepções industrialistas de educação, baseadas em teorias econômicas: a democratização do acesso à educação, por analogia aos conceitos de produção industrial de massa, mercado de consumo de massa e economia de escala, passa a ser vista como educação de massa voltada para o mercado de trabalho. As atuais contestações desse paradigma, ainda bastante dominante, agrupadas nos conceitos de "neofordismo e pós-fordismo, propõem para a educação as mesmas mudanças que estão acontecendo no mundo da economia e do trabalho, conseqüências da globalização econômica e do avanço tecnológico sem precedentes que obriga as empresas a se adaptarem: flexibilização (currículos e métodos), descentralização (inter e multiculturalidades), maior responsabilização do trabalhador melhor habilitado" (Campion e Renner, op. cit. e Evans 1995).
Nos países periféricos, a escola está perdida em meio a essas culturas híbridas de mensagens pré-modernas, disseminadas em suportes high tech; de políticas arcaicas propostas em discursos inovadores produzidos por marketings eficientes. Baseada no discurso escrito, nos valores seguros do erudito e no papel firme e insubstituível da professora, a escola no Brasil abriu mão, sem os realizar, dos ideais modernos - conhecer para se emancipar - e tentou ser apenas e diretamente instrumental ao mercado. Restringindo-se ao treinamento do trabalhador, a reforma da educação realizada nos anos 70 evitou formar o cidadão, numa perspectiva tecnocrática cuja eficácia foi medíocre.
O campo da educação confronta-se agora com mais uma crise de paradigmas: ainda não temos biblioteca e já temos computador. Ainda não aprendemos a lidar com a TV e já chega a multimídia. Como recuperar o tempo perdido? Pela Internet?
Escola e cidadania...
Poderíamos sintetizar o longo relato acima dizendo que a escola do futuro tem de realizar a promessa moderna, iluminista, de emancipação, integrando-se ao universo da cultura pós-moderna: isso significa escola para todos com qualidade, isto é, com tecnologia e com educação para o uso das mídias.
Do ponto de vista da construção do conhecimento, isso significa antes de mais nada a integração de dois campos culturais: a educação e a comunicação, ambas estruturadas como espaços de luta entre grupos e interesses contraditórios, ambas importantes no processo de criação e transmissão da cultura. No campo da educação e no da comunicação, agentes e instituições se confrontam apropriando-se desigualmente do capital simbólico específico de cada um deles (Bourdieu 1994).
No Brasil, a história desses dois campos mostra trajetórias bem diferentes. No campo da comunicação, os principais atores são privados e o processo incorpora rapidamente as inovações técnicas. O papel do Estado tem sido mais próximo ao de cliente preferencial e generoso do que ao de instância de regulação. No campo da educação, ao contrário, os atores mais importantes são públicos, os investimentos, insuficientes e o processo tende a resistir à mudança, especialmente à incorporação de novas técnicas.
Enquanto a escola, pobre e abandonada, vive uma crise que não é só paradigmática, mas também de identidade e de auto-estima, perplexa diante da multiplicidade e da complexidade de suas novas tarefas, as mídias triunfantes invadem os espaços mais reservados do cotidiano, tornando-se extensões naturais de nossos sentidos, concretizando assim as profecias de McLuhan.
O capital cultural com melhor valor no mercado das trocas simbólicas está mais no campo da comunicação, seja no mundo real dos negócios (onde 30 segundos de publicidade podem valer o salário de dez mil professores), seja no mundo simbólico do imaginário popular, especialmente na percepção dos jovens, que sonham com a celebridade aparentemente fácil ofertada pelas mídias.
Na intersecção desses dois campos, ocorre o processo de socialização das novas gerações, processo extremamente complexo que integra de modo interativo todos os elementos do meio ambiente da criança. Nesse processo atuam muitas instituições: a família, a escola e a Igreja eram as principais. Agora atuam também nesse processo, de modo voluntário e insistente, inúmeras empresas produtoras e distribuidoras de "bens culturais": os sistemas de mídia (Belloni 1992 e 1994).
A escola ainda não conseguiu integrar esses bens culturais produzidos pelas mídias, e que são consumidos pela maioria das crianças, consumo este desigualmente distribuído entre grupos sociais. A escola de qualidade terá que integrar as novas tecnologias de comunicação de modo eficiente e crítico, sem perder de vista os ideais humanistas da modernidade (isto é, evitando aquele velho mecanismo que consiste em jogar fora a criança com a água do banho), mostrando-se capaz de colocar as tecnologias a serviço do sujeito da educação - o cidadão livre -, e não a educação a serviço das exigências técnicas do mercado de trabalho.
O campo da comunicação é um campo cultural que cresce em importância e visibilidade no mercado globalizado e está caracterizado pelo uso intensivo de meios tecnológicos de transmissão de informações. Esse campo se estrutura em sistemas de mídia que preenchem diferentes funções: ideológica, informativa, de entretenimento, cognitiva etc. É no cumprimento eficiente dessas funções que as mídias vão penetrando e interferindo na ação de outras instituições em outros campos, como a família, invadida pela moral das telenovelas e dos desenhos animados, ou a escola, que ainda não sabe lidar com suas mensagens e linguagens. Para não falar das religiões que tiveram que se adaptar a elas.
O campo da educação enfrenta, pois, mais este desafio: o de constituir-se em espaço de mediação entre a criança e esse meio ambiente tecnificado e povoado de máquinas que lidam com a mente e o imaginário. Cabe à escola não só assegurar a democratização do acesso aos meios técnicos de comunicação os mais sofisticados, mas ir além e estimular, dar condições, preparar as novas gerações para a apropriação ativa e crítica dessas novas tecnologias. É função da educação formar cidadãos livres e autônomos, sujeitos do processo educacional: professores e estudantes identificados com seu novo papel de pesquisadores, num mundo cada vez mais informacional e informatizado.
Isso exige transformações radicais no campo da educação: será preciso reavaliar teorias e reinventar estratégias e práticas. À universidade cabe investir na produção acadêmica de conhecimento novo e inovador, repensar aspectos teóricos e metodológicos e integrar efetivamente o ensino e a pesquisa.
A escola do presente e do futuro, aquela que todos queremos, tem de resgatar os ideais da modernidade clássica transformando-os para adaptá-los à modernidade radical, às infinitas possibilidades ofertadas pelas tecnologias de comunicação e de informação. Somente com a modernização radical do campo educacional - que vai da pesquisa acadêmica às estratégias políticas - poderá a escola cumprir sua função social: a de formar o cidadão autônomo, competente técnica e politicamente.
...comunicação e tecnologia
Em primeiro lugar, será preciso redefinir o papel do educador: será ele um engenheiro do conhecimento, misto de programador e artista, tutor a distância ou em presença, facilitador ou orientador de uma aprendizagem baseada em materiais multimidiáticos, ou um pesquisador, ator, com seus alunos, na construção do conhecimento? A complexidade de suas tarefas exige uma formação inicial e continuada totalmente nova. Como formar o professor que a escola do futuro exige? Na formação do professor do futuro está em jogo o futuro do professor, se me é permitido o trocadilho.
As respostas a essa pergunta crucial são muitas e estão longe de ser unânimes, mas parecem sinalizar uma tendência a se agruparem em torno da idéia de reflexão. Esse conceito amplo e fluido parece ser o mais utilizado por pesquisadores e formadores para referir novas tendências na formação de professores. Muitas concepções do professor e do ensino podem ser englobadas por essa concepção mais ampla: o professor que experimenta, o professor pesquisador na ação, o professor como pedagogo radical, e muitas outras. Todas essas novas tendências se declaram reflexivas (Garcia 1992, p. 59).
Não obstante a grande diversidade de propostas teóricas e metodológicas e uma certa "dispersão semântica", é possível identificar dois componentes comuns a essas novas propostas de formação de professores: por um lado, a idéia de pesquisa e de reflexão constante sobre a própria prática pedagógica (desde o construtivismo, entendida ela própria como um processo de pesquisa para construção do conhecimento), e, por outro, a convicção de que será fundamental estabelecer uma nova relação mais horizontal (menos verticalizada e autoritária) entre professores e alunos, entendidos como parceiros diferenciados no processo educativo (idem, p. 62).
Em tese, essas concepções seriam bastante propícias à integração, dos meios técnicos de comunicação e de informática, aos processos educacionais, uma vez que a reflexão sobre a própria prática "conduz necessariamente à criação de um conhecimento específico e ligado à ação, que só pode ser adquirido através do contato com a prática, pois trata-se de um conhecimento tácito, pessoal e não sistemático" (idem, p. 60).
Embora se possa considerar como autocomplacência de uma categoria profissional em crise de auto-estima, aquela velha atitude que consiste em evitar as novas tecnologias sob o pretexto de que elas assumiriam o papel do professor, desumanizando o processo de educação, também é preciso lembrar que sem uma formação adequada não se pode esperar que o professor resolva sozinho um problema cuja complexidade o ultrapassa. Ao contrário, o uso adequado das incríveis potencialidades oferecidas por aqueles meios representaria para o professor uma libertação das tarefas de "repetidor" que ocupam a maior parte de seu tempo, deixando-o livre para desempenhar múltiplos papéis mais criativos e mais interessantes (e, evidentemente, mais adequados aos tempos que correm).
Segundo Perriault, o papel do professor é "chamado a evoluir":
Quando estiver rodeado de mídias, ele não mais veiculará todo o conhecimento mas ajudará os alunos a assimilá-lo bem. Responderá às questões difíceis. No ensino a distância nota-se a importância crescente do telefone: os inscritos chamam o professor para `depanagens'. (Perriault, 1996, p. 82)
Do ponto de vista do macroplanejamento, é ilusório pensar que se fará economia de orçamento com o uso de tecnologias ou com o ensino a distância. Ao contrário do que se tem muitas vezes ouvido autoridades do setor declararem, a integração das novas tecnologias à educação não significará economia de custos: o professor terá que ser valorizado e sua formação inicial e continuada terá que ser repensada, além dos investimentos em equipamentos, é claro. Mas certamente o investimento em formação de professores com tecnologias resultará em aumento de produtividade dos sistemas e, portanto, a médio e longo prazo significará maior rentabilidade, evitando não só o desperdício com o fracasso escolar, como as frustrações decorrentes dele e da inadequação às demandas sociais.
O "método" mais geral da formação de professores sendo a reflexão, resta ainda definir o que seria essa formação. Quais critérios utilizar? Um elenco de "destrezas" necessárias à prática de um "ensino reflexivo" (Garcia, op.cit., p. 61)? Ou a reflexão sobre experiências inovadoras de utilização de meios técnicos para ir construindo novas metodologias, novos materiais, por exemplo?
Uma nova pedagogia já está sendo inventada que concebe as tecnologias como meios, linguagens ou fundamentos das metodologias e técnicas de ensino, sem esquecer de considerá-las como objeto de estudo e reflexão, assegurando sua integração crítica e reflexiva aos processos educacionais. Há pesquisadores que tendem a considerar a tecnologia como o fundamento dessa nova pedagogia (Pretto 1996). Mas nesse caso não correríamos o risco de vê-la submetida à lógica instrumental da produção industrial? Será possível escapar dessa lógica e assegurar uma autonomia relativa ao campo da educação?
Parece-me mais apropriado dizer que o fundamento dessa nova pedagogia tem de ser a pesquisa, como mecanismo central do processo de construção do conhecimento, do qual professores e alunos participem criativamente, redefinindo radicalmente os papéis e as relações entre eles e potencializando de modo inédito a construção coletiva do conhecimento.
A nova pedagogia deve permitir a apropriação dos saberes e das técnicas, incorporando-os à escola de modo a valorizar a cultura dos alunos e a criar oportunidades para que todas as crianças tenham acesso a esses meios de comunicação. Humanizar as máquinas de comunicar, dominá-las, sujeitando-as aos princípios emancipadores da educação, eis aí o desafio que está posto.
Em um outro momento afirmei que o confronto escola e televisão era, mais que nada, uma questão de linguagem (Belloni 1995a). Queria então enfatizar o caráter instrumental da tecnologia - que pode estar a serviço do "bem" ou do "mal" - e ressaltar que o meio é a mensagem e que as linguagens (inclusive a linguagem audiovisual e a informática) são fundamentos do pensamento e estruturam o conhecimento. Gostaria agora de destacar alguns aspectos técnicos dessa questão, sem perder de vista as variáveis externas ao campo da educação as quais em grande parte o determinam, embora não as integrando diretamente no campo de análise.
Como se apropriar dessas linguagens, dominar esses meios técnicos, integrando-os ao cotidiano da escola? Não há receitas prontas, mas alguns caminhos óbvios já estão delineados. Os tópicos que se seguem são sugestões do que poderia ser feito para a formação de professores capazes de iniciar esse processo de atualização que levaria a escola a realizar as promessas da modernidade num estilo pós-moderno. Eles representam uma receita técnica um tanto óbvia, mas tecnocrática, no sentido em que não são consideradas as determinantes sociais, políticas e econômicas.
• Produzir conhecimento
Em primeiro lugar, será preciso conhecer o assunto, produzir conhecimento novo, buscando pôr em evidência todos os aspectos da questão. Abre-se um novo e vasto campo de pesquisa que diz respeito aos "modos de aprendizagem mediatizada" (Perriault 1996, p. 241). Esse novo campo, necessariamente interdisciplinar, tem de considerar os dois principais componentes dessa nova pedagogia: a utilização cada vez maior das tecnologias de produção, estocagem e transmissão de informações, por um lado, e, por outro, o redimensionamento do papel do professor. Papel este que, ao que tudo indica, tende a ser cada vez mais mediatizado. O professor duplamente mediatizado: como produtor de mensagens inscritas em meios tecnológicos, destinadas a estudantes a distância, e como usuário ativo e crítico e mediador entre esses meios e os alunos.
Os aspectos cognitivos, especialmente aqueles relacionados com a "autodidaxia", por exemplo, são de extrema relevância para se compreender como funciona a auto-aprendizagem numa situação de ensino mediatizado. Os novos "modos de aprender" são ainda uma incógnita para a maioria dos professores.
A pesquisa sobre linguagens e potencialidades comunicacionais dos diferentes meios tecnológicos deve avançar nas tecnicalidades sem perder de vista os objetivos ou fins da ação educativa: é fundamental encarar as tecnologias como ferramentas, como meios, o que inclui as máquinas, mas também os programas, e sobretudo os saberes, instrumentos intelectuais e verbais (Trindade 1992). A introdução da imagem e seus suportes técnicos (a tela da televisão e do computador) no universo da palavra escrita suscita muitas interrogações ainda sem resposta. Como utilizar a imagem como fonte de saber? Como integrar esse novo conhecimento adquirido pelos jovens diante das muitas telinhas? Não o conhecimento de um determinado conteúdo, mas a competência específica de leitura de imagens e sinais eletrônicos?
Será preciso investir na análise, na seleção e na avaliação de experiências e materiais educacionais, sem deixar de promover a elaboração e a experienciação de estratégias e materiais inovadores.
Para desenvolver a pesquisa nessa área, o caminho não é simples: seria necessário um esforço no sentido de estimular a criação e a consolidação de linhas de pesquisa, integrando o ensino de pós-graduação e o de graduação, as vertentes teóricas e práticas, e trabalhar numa perspectiva interdisciplinar, integrando notadamente os campos da comunicação e da educação.
Infelizmente, esse aspecto é extremamente pouco desenvolvido em nossas universidades: o tema está longe de ser importante na produção científica do campo da educação e a integração entre graduação e pós-graduação é ainda bastante rara em nossos cursos de pedagogia e licenciaturas.
• Criar laboratórios
No contexto brasileiro, o desenvolvimento desse novo campo de pesquisa poderia acontecer nas universidades, com a instalação de laboratórios de multimeios que funcionassem como laboratórios de ensino e de pesquisa e como campo de estágio para estudantes de graduação e pós-graduação da área da educação, mas também de comunicação, de informática, de artes, letras e muitas outras.
As disciplinas de formação pedagógica (licenciaturas e pedagogia) poderiam ser desenvolvidas de modo integrado e interdisciplinar, ligadas aos laboratórios de ensino, equipados para a utilização e a produção de materiais pedagógicos. Os cursos de pós-graduação deveriam estar integrados com a graduação, tanto na realização de pesquisas quanto na prática docente ou monitoria em laboratório. Essa integração é condição necessária para o sucesso de qualquer experiência de modernização na educação: é aí que se pode produzir o conhecimento inovador, sob a forma de estratégias de utilização de materiais pedagógicos.
Num registro ideal, poderíamos imaginar a criação de centros de recursos públicos, a exemplo das maisons du savoir propostas por Perriault, midiatecas completas que coloquem à disposição dos usuários toda a riqueza de materiais e máquinas, permitindo a estudantes e professores realizarem suas pesquisas.
Serão imprescindíveis a interdisciplinaridade e a colaboração de profissionais de outros campos que virão necessariamente contribuir com o campo da educação, profissionais das áreas de comunicação e informática, principalmente mas não só, que trabalharão de modo integrado aos profissionais do campo da educação. Novas funções estão surgindo que exigem novas definições profissionais e de formação.
• Inventar metodologias de ensino
Com base em estratégias integradoras e interdisciplinares, não apenas integrar "disciplinas", mas desenvolver ações integradas entre os diferentes cursos de formação de professores e especialistas que culminem em estágios que levem para as escolas propostas inovadoras, integradas, orgânicas, propostas de pesquisa-ação que revolucionem o cotidiano escolar. Um primeiro passo importante pode ser dado com propostas de educação para a mídia que introduzam na escola a discussão sobre o tema.
É importante lembrar que a tendência atual é de uma maior mediatização do processo de educação (a exemplo e na esteira do que já ocorreu no processo de comunicação e em muitas outras esferas sociais) em direção ao estabelecimento de formas híbridas de educação e de formação continuada (mediatização do ensino presencial, ensino a distância, utilização de redes informáticas interativas etc.).
• Investir na produção de materiais
A ênfase deveria ser colocada no uso de materiais pedagógicos em suportes multimidiáticos (escrito, vídeo, áudio, multimídia) e nos equipamentos necessários para sua realização e leitura: é preciso equipar laboratórios e criar midiatecas, possibilitando aos estudantes a operação dos equipamentos e o contato com materiais pedagógicos em suportes tecnológicos.
É preciso desmitificar a tecnologia. O vídeo e a televisão são velhas tecnologias que não oferecem nenhum problema de operação. Há que aprender a avaliar, selecionar, criar estratégias de utilização. Quanto à informática, ela está se tornando uma linguagem dominante, e seu casamento com o vídeo e o texto, na multimídia, engendra a mídia do futuro. É preciso também considerar com atenção o seguinte conselho:
A elegância é uma qualidade estética feita de simplicidade e de graça que se presta a certas formas. Esse ponto de vista distancia o olhar sobre a tecnologia da educação, ajudando a atualizar o julgamento que se faz dela. Essa atualização é urgente pois uma autodidaxia importante se desenvolve desde há alguns anos nos jovens por meio das mídias. (Perriault 1996, p. 231)
Faz parte dos resultados dessa "autodidaxia" não apenas a desenvoltura com que os jovens manipulam os jogos eletrônicos, mas também a habilidade para julgar a qualidade técnica e a estética de qualquer material audiovisual. O que implica e exige materiais de boa qualidade didática (metodologias adequadas), mas também técnica e estética.
Segundo esse mesmo autor, a evolução do uso das mídias para a educação mostra tendências divergentes, que podem ser agrupadas em duas categorias básicas:
• mídias que põem em comunicação um ser humano e uma máquina, da qual ele extrai informações que transforma em conhecimento;
• mídias que ligam seres humanos entre si, para que eles troquem informações e juntos construam conhecimentos.
Na primeira categoria temos o ensino assistido pelo computador, os livros, vídeos e CD-ROMs, por exemplo; e na segunda temos as trocas telefônicas, consultas ao tutor via telemática, alguns usos das redes informáticas (Internet), videoconferências interativas etc.
Essa evolução estaria, segundo Perriault, mostrando um desenvolvimento mais rápido nos usos de meios da segunda categoria, o que sinalizaria para utilizações mais horizontais e democráticas - e humanizadas - que as possibilitadas pelas "máquinas de ensinar" skinnerianas.
Sem dúvida, as tecnologias podem ser novos e muito úteis meios de construir e difundir conhecimentos sem risco de desumanizar o ser humano. Tudo depende do modo como as utilizamos: se nos apropriamos de seu potencial pedagógico e comunicacional e as colocamos a serviço do homem ou se, ao contrário, nos deixamos dominar por elas, transformando-nos em consumidores de gadgets concebidos para um mercado de massa planetário.
Technology and teacher training: Towards a post-modern pedagogy?
ABSTRACT: Starting from a discussion on the controversial concepts of modernity and post-modernity, this text is an attempt to highlight the ideals and achievements of modern society in two increasingly complementary areas in the socialisation process of new generations: those of education and communication. Considering the growing importance of the communicational phenomenon in our globalised and technified contemporary society, education is required to serve as mediator between the child and an environment populated by ever more "intelligent" machines.
Using as theoretical basis the necessary and inevitable integration of new information and communication technologies into education field, the author attempts to mark out some paths towards an innovative view of teacher training which is indispensable for an improved schooling today and tomorrow.
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* Professora do Depto. de Metodologia de Ensino, Centro de Ciências da Educação, UFSC.
Educação& Sociedade
Print ISSN 0101-7330
Educ. Soc. vol. 19 n. 65 Campinas Dec. 1998
Tecnologia e formação de professores: Rumo a uma pedagogia pós-moderna?
Maria Luiza Belloni*
RESUMO: A partir da discussão dos controvertidos conceitos de modernidade e pós-modernidade, este texto busca destacar os ideais e as conquistas da sociedade moderna em dois campos cada vez mais complementares no processo de socialização das novas gerações: a educação e a comunicação. Considerando a crescente importância do fenômeno comunicacional na sociedade atual, globalizada e tecnificada, a educação é chamada a constituir-se em espaço de mediação entre a criança e um meio ambiente povoado de máquinas cada vez mais "inteligentes". Tendo como eixo teórico a integração - necessária e inelutável - ao campo educacional, das novas tecnologias de comunicação e de informatização, a autora tenta delinear alguns caminhos para a formação de professores numa perspectiva inovadora, indispensável para a melhoria da qualidade da escola do presente e do futuro.
Palavras-chave: Formação de professores, tecnologia e educação, comunicação educacional, pós-modernidade, inovação pedagógica
Modernidade radical
Analisando correntes/teorias/movimentos ditos pós-modernos, Giddens parte da compreensão da natureza da própria modernidade, para concluir que o que chamamos "pós moderno" corresponde a um período em que "as conseqüências da modernidade estão se tornando mais radicalizadas e universalizadas do que antes" (1991a, p. 13).
Para compreender como seria (ou deveria ser) a escola que corresponde a essa modernidade radical - e principalmente para compreender as relações entre educação e comunicação -, proponho ir buscar, nas raízes do projeto humanista da modernidade, a significação das duas maiores conquistas do homem moderno: o direito à educação (universal, igualitária, democrática) e o direito à comunicação (livre e plural).
Quando os filósofos iluministas pregavam os ideais da modernidade contra o antigo regime, uma revolução política já estava a caminho, no bojo da transformação econômica: um novo modo de produção e de apropriação da riqueza social se instalava na Europa Ocidental. O Estado democrático moderno, baseado no indivíduo emancipado (nem nobre nem servo) e moralmente autônomo, expressa e consolida novas lealdades, novos sistemas de legitimação política, mais adequados ao capitalismo emergente.
Um dos mais importantes ideais da modernidade é, sem dúvida, a igualdade civil entre todos os indivíduos dotados de razão, agora transformados em trabalhadores livres e cidadãos autônomos. Este era um ideal a construir, a conquistar: a emancipação política e a autonomia moral, que fazem de qualquer homem um indivíduo livre e um cidadão, precisavam ser cultivadas e difundidas para atingir a todos através da educação e da comunicação.
O direito à educação deveria ser universalizado atingindo a todas as crianças que deveriam ser alfabetizadas para ler os textos (sagrados e profanos) e ser treinadas para conhecer os saberes e as técnicas desenvolvidas pela humanidade.
O direito à comunicação corresponde à criação de um novo espaço público de discussão livre e "pública" (no sentido de transparente), identificado com o direito de expressão das opiniões do cidadão emancipado e esclarecido e com o dever de exigir a "publicização" (transparência) dos negócios do Estado (Belloni 1995b).
A universalização da educação, realizada pela escola pública e laica, é um projeto iluminista como o é a livre expressão de idéias, consagrada na imprensa livre e independente. Do mesmo modo, a sociedade moderna é um "projeto de saber".
O projeto humanista da modernidade acreditava no progresso infinito da humanidade, baseado na Razão e no Saber, apontando para a utopia da igualdade natural dos homens: aquela dada pela racionalidade. Deus ainda estava vivo, mas já não era tão necessário. O racionalismo (incluindo o direito natural) surgia como novo paradigma.
Uma nova ética - protestante - adequada ao espírito dos novos tempos - capitalista - estabelecia uma relação direta entre Deus e o indivíduo moralmente autônomo, dotado de razão capaz de ler e compreender a palavra sagrada e fazer sua escolha entre o bem e o mal, dispensando a intermediação do clero católico, os comunicadores do antigo regime. A nova ética de cidadãos livres e indivíduos autônomos não admite mais a interferência na privacidade (identificada com a família e o lar) representada pela exigência católica da confissão, por exemplo.
A modernidade corresponde, pois, a uma certa racionalidade (que os pensadores de Frankfurt qualificam como instrumental), a um desencantamento do mundo (que Weber afirma inelutável), e ao progresso espantoso das ciências experimentais e dos avanços tecnológicos. Tudo isso em conexão com uma organização racionalista da sociedade que culminaria com empresas eficientes e aparelhos estatais bem organizados (Canclini 1989, p. 22).
A modernidade pode também ser entendida como um "processo civilizatório". Muito mais ampla que um modo de produção, ela significa um novo paradigma, uma nova racionalidade, uma promessa de sociedade baseada em dois pilares potencialmente contraditórios: a regulação (constituída pelos princípios do Estado, do mercado e da comunidade) e a emancipação (com três lógicas de racionalidade: estética, moral e técnica) (Santos 1994, p. 31).
Pela sua complexidade interna, pela riqueza e diversidade das idéias novas que comporta e pela maneira como procura a articulação entre elas, o projeto da modernidade é um projeto ambicioso e revolucionário. As suas possibilidades são infinitas, mas por o serem, contemplam tanto o excesso das promessas como o déficit do seu cumprimento.(...) O excesso reside no próprio objetivo de vincular o pilar da regulação ao pilar da emancipação e de os vincular a ambos à concretização de objetivos práticos de racionalização global da vida coletiva e da vida individual. (idem, p. 71)
As promessas cumpridas em excesso revelam-se nas muitas formas do imenso progresso da ciência e da tecnologia e suas infinitas possibilidades de aplicação no mercado. Por outro lado, na esteira desse progresso, as promessas de emancipação acabaram se transformando no "lado cultural da regulação", um processo bem caracterizado por Gramsci com o conceito de hegemonia (ib., p. 78).
Na utopia iluminista, a educação desempenhava um papel social de grande importância, inédito na história da humanidade: coerente com a crença no progresso baseado no saber, o projeto da modernidade atribui à escola a função de socializar as novas gerações, formando os futuros cidadãos respeitadores das instituições sociais e do Estado. A educação moral e cívica deve formar igualmente o trabalhador e a elite, iguais na cidadania, porém cada grupo em sua função, todos contribuindo para o progresso da sociedade. A escola ganha status de instituição oficial, pública, mantida pelo Estado, tendo como principais características sua independência religiosa (laica e científica) e seu caráter universal (igual para todos). É a escola da cidadania.
Na prática, na passagem pelo século XIX da Revolução Industrial e do positivismo, a escola moderna evoluiu do ideal revolucionário de emancipação à consolidação de uma instituição eficiente na reprodução das desigualdades sociais (Bourdieu e Passeron 1970). Sem nunca deixar de ser um espaço de luta entre diferentes grupos sociais, a instituição escolar vai perdendo seu potencial emancipador, para ir se transformando em mecanismo eficaz de regulação.
Também no campo da comunicação, um novo agente social foi se formando: a opinião pública e seu porta-voz, a imprensa. O espaço público moderno vai se constituindo como locus de discussão livre sobre as regras da sociedade civil e do Estado: ali se discutem livremente as cotações do mercado, as novidades literárias e os abusos do poder político. A imprensa, a mídia da época tornada possível graças a um invento revolucionário (a prensa tipográfica de Gutemberg), vai desempenhar um papel extremamente importante nesse processo de formação do cidadão autônomo. Da mesma forma que no Nordeste de Paulo Freire nos anos 60, no século XVIII europeu saber ler era condição sine qua non da cidadania. No Terceiro Milênio, da cultura cibernética e da realidade virtual, ser cidadão exige saber digitar, até mesmo literalmente, na urna eletrônica.
A escola moderna, formadora do cidadão emancipado e autônomo, nascia sob o signo da palavra impressa que tinha uma conotação democrática e subversiva. A escola da pós-modernidade, do futuro, terá que formar o cidadão capaz de "ler e escrever" em todas as novas linguagens do universo informacional em que ele está imerso.
... ou pós-modernidade?
Ao fim do século XX, no limiar do novo milênio, 200 anos depois da Revolução Francesa, aqueles ideais do Iluminismo (sobretudo quando vistos desde o hemisfério sul) parecem ter-se "desmanchado no ar" sem nunca terem sido realmente "sólidos" (Berman 1988).
Aos ideais universais e às grandes teorias sociais opõem-se agora valores heteróclitos e narrativas fragmentadas; o espaço público dos salões e dos cafés burgueses é substituído pelo simulacro espetacular repetido incessantemente pelas diferentes mídias. Ao público esclarecido se opõe a massa indiferenciada de consumidores, agora em escala planetária.
Os grandes movimentos intelectuais e políticos (Iluminismo, liberalismo, positivismo, socialismo) são agora relegados ao plano de simples "metarrelatos" (ou metanarrativas) intrinsecamente diferentes entre si, porém com a qualidade comum de não terem mais nenhuma hegemonia. A proclamação do fim da história faz parte dessa retórica, como uma expressão do neoliberalismo radical, que apresenta seu modelo de mercado global para todos, para sempre, como o ponto de chegada do projeto iluminista.
No universo fragmentado da cidade pós-moderna, todas as narrativas se equivalem; não há valores universais que embasariam um consenso qualquer: o relativismo culturalista aponta para a fragmentação infinita que acaba por uniformizar tudo na lógica da mercadoria.
A escola é agora apenas mais uma entre as muitas agências especializadas na produção e na disseminação da cultura. Em concorrência com as diferentes mídias, a escola tende a perder terreno e prestígio no processo mais geral de transmissão da cultura e particularmente no processo de socialização das novas gerações, que é sua função específica. Num mundo cada vez mais "aberto" e povoado de máquinas que lidam com o saber e com o imaginário, a escola apega-se ainda aos espaços e tempos "fechados" do prédio, da sala de aula, do livro didático, dos conteúdos curriculares extensivos, defendendo-se da inovação.
No campo da comunicação, duas tendências aparentemente contraditórias delineiam-se claramente: de um lado, uma extrema concentração da produção globalizada de bens culturais com base na publicidade; de outro, uma fragmentação cada vez mais acentuada de textos, máquinas, meios, mitos, linguagens e públicos que se mesclam, se adaptam e transformam as diversidades culturais.
A pós-modernidade é algo fugidio, difícil de cernir. Podemos considerar a pós-modernidade como uma certa "dominante cultural", típica do capitalismo tardio, disseminada por todo o planeta (Jameson); ou como "novo paradigma" do conhecimento e o fim dos "metarrelatos" (Lyotard); ou ainda simplesmente como um "estilo" cultural, compreendendo aspectos estéticos e de consumo. Em qualquer dessas abordagens estão presentes as idéias de fragmentação, simulacro (ou pastiche), de multiplicidade (Yudice 1995).
Habermas considera, no entanto, que o que se convencionou chamar pós-modernidade é um impasse político-cultural (ou uma transição difícil) na realização do projeto emancipador, ainda incompleto, da modernidade, que tem como força propulsora uma nova "racionalidade comunicativa democratizadora", que se sobreporá à racionalidade instrumental (idem, p.79).
Já para Boaventura de Souza Santos, "o projeto não pode ser concluído em termos modernos sob pena de nos mantermos prisioneiros da mega-armadilha que a modernidade nos preparou: a transformação incessante das energias emancipatórias em energias regulatórias" (Santos 1994, p. 84).
Nesse contexto de imprecisão e insegurança conceitual, a questão fundamental para compreender o papel da educação na pós-modernidade continua posta e ganha novo significado: pode-se esperar que a cultura (incluindo educação e comunicação) tenha ainda um potencial emancipador? Ou a pós-modernidade constitui mais um metarrelato de caráter conformista, a legitimar um capitalismo globalizado, "tardio" e perverso? Uma versão estético-expressiva do "cada-um-por-si" do neoliberalismo?
Essa nova cultura "pós-moderna" constitui o estilo de vida próprio do capitalismo contemporâneo e toma formas diferentes segundo as socioculturas. Embora disseminado por todo o mundo dito "civilizado", isto é, atingível pela televisão via satélite, o estilo pós-moderno apresenta uma diversidade enorme de facetas que espelham as realidades locais. Nos Estados Unidos, por exemplo, a proposta pós-moderna gerou um discurso ideológico e um movimento social que tomaram uma forma um tanto puritana, típica da cultura americana racionalizada, pragmática e individualista: o multiculturalismo politicamente correto.
Já na América Latina, no Brasil e no México, por exemplo, temos culturas híbridas, nas quais coexistem, adaptam-se e transformam-se muitos elementos da modernidade, sentimentos e lealdades pré-modernos e situações comunicacionais de alta tecnicidade e de caráter "pós-moderno" (Canclini 1989).
Nessas culturas híbridas, nas quais o moderno se integra com o pré e o pós-moderno, o "realismo mágico", por exemplo, é um realismo tout court, a realidade é que é mágica, absurda do ponto de vista da racionalidade ocidental que define o paradigma dominante do conhecimento. Nessas culturas híbridas, as narrativas antigas e arquetípicas adaptam-se às linguagens audiovisuais e aos estilos pós-modernos, configurando mensagens que nada mais têm a ver com os mitos originais de que são referências, senão seu poder de persuasão: assim as novelas, os folhetins diversos, a música, o cinema. Os limites entre a cultura erudita e a popular foram confundidos pela cultura de massa, onde tudo se mistura, se fragmenta e se repete como numa sala de espelhos.
O caráter heterogêneo das sociedades latino-americanas fez surgirem "formas descontínuas, alternativas e híbridas que desafiaram a hegemonia do grande relato da modernidade", caracterizando uma espécie de pós-modernidade avant la lettre (Yudice 1995, p. 64).
Há, porém, uma característica comum a todas essas mensagens fragmentadas e sem coerência: justamente o espelho - os sistemas de mídia que multiplicam ao infinito qualquer mensagem (obra de arte erudita, manifestação popular ou informação), esvaziando-a de seu significado específico e privando-a de sua autenticidade, ao transformá-la em produto midiático, subordinado à lógica da produção globalizada. Um dos fenômenos mais interessantes quanto a essas culturas híbridas, de que nos fala Canclini, é a importância, para sua constituição, do avanço incrível das técnicas de comunicação radicalizando os conceitos modernos de tempo e de espaço, mesclando o rural e o urbano, redimensionando os modos de ser e de apreender o mundo, transformando a humanidade e o indivíduo.
Cabe lembrar que a distância entre espaço e tempo é típica da modernidade, sendo seu emblema o relógio mecânico, a máquina moderna que permitiu separar o tempo (tornado abstrato) e o lugar (que até então era a referência para o tempo). A invenção do relógio foi fundamental para o cálculo do valor do trabalho industrial assalariado, como todos sabemos, que assim se autonomiza (separa) do ciclo natural do tempo, válido na agricultura (Giddens 1991a, p. 25). As redes informáticas e os satélites de comunicação estão operando mais um redimensionamento de nossas noções de tempo e de espaço. Outros autores, trabalhando no campo do ensino a distância e inspirados em Giddens, consideram que a globalização representa uma "nova consciência mundial trazida pela compressão do tempo e do espaço", o que teria profundas implicações para o ensino a distância, concebido em termos mundiais (Stevens 1996 e Edwards 1994).
Nesse quadro de incertezas, neste fim de século cheio de riscos (Giddens 1991a e 1991b) e de redefinições, atribuir ao estilo cultural pós-moderno um caráter emancipatório (como a ilusão multiculturalista) parece-nos otimismo ingênuo, pois esquece que a base econômica ainda é capitalista e sua ideologia neoliberal ainda mantém a hegemonia em quase todo o planeta. Parece difícil saber, hoje, se as culturas híbridas dos países periféricos (frutos do casamento de conveniência entre as culturas populares locais e os sistemas de mídia) encerram um potencial emancipador, configurando uma "pós-modernidade de resistência" (Santos 1994, p. 91), ou se o discurso pós-moderno consolida a hegemonia de uma cultura mundializada que tende a mascarar a importância do avanço tecnológico para o aprofundamento das desigualdades sociais e regionais.
A mídia, que no século XVIII surgiu como um instrumento de emancipação, tornou-se, no século XX, um meio eficiente de dominação e controle social, em que pese a fragmentação pós-moderna de mensagens e públicos. Seu uso emancipatório é eventual e episódico. Embora seja importante ressaltar que a "explosão da realidade midiática e informacional torna possível uma competência democrática mais alargada" (Santos, id., p. 83), a eficácia política e social dessa competência resta a ser determinada.
Quanto à educação, teorias baseadas em modelos inspirados no "paradigma fordista", dominante no mundo capitalista desde as primeiras décadas do século XX, tiveram grande impacto sobre políticas e práticas educacionais, principalmente no período após a Segunda Guerra Mundial. É importante lembrar que, nesse período, a oferta de serviços públicos pelo Estado cresceu muito e se organizou segunda a lógica fordista (Campion e Renner 1992). O crescimento da demanda de educação pública, especialmente de 1º e 2º graus, criou as condições que estimulam e legitimam concepções industrialistas de educação, baseadas em teorias econômicas: a democratização do acesso à educação, por analogia aos conceitos de produção industrial de massa, mercado de consumo de massa e economia de escala, passa a ser vista como educação de massa voltada para o mercado de trabalho. As atuais contestações desse paradigma, ainda bastante dominante, agrupadas nos conceitos de "neofordismo e pós-fordismo, propõem para a educação as mesmas mudanças que estão acontecendo no mundo da economia e do trabalho, conseqüências da globalização econômica e do avanço tecnológico sem precedentes que obriga as empresas a se adaptarem: flexibilização (currículos e métodos), descentralização (inter e multiculturalidades), maior responsabilização do trabalhador melhor habilitado" (Campion e Renner, op. cit. e Evans 1995).
Nos países periféricos, a escola está perdida em meio a essas culturas híbridas de mensagens pré-modernas, disseminadas em suportes high tech; de políticas arcaicas propostas em discursos inovadores produzidos por marketings eficientes. Baseada no discurso escrito, nos valores seguros do erudito e no papel firme e insubstituível da professora, a escola no Brasil abriu mão, sem os realizar, dos ideais modernos - conhecer para se emancipar - e tentou ser apenas e diretamente instrumental ao mercado. Restringindo-se ao treinamento do trabalhador, a reforma da educação realizada nos anos 70 evitou formar o cidadão, numa perspectiva tecnocrática cuja eficácia foi medíocre.
O campo da educação confronta-se agora com mais uma crise de paradigmas: ainda não temos biblioteca e já temos computador. Ainda não aprendemos a lidar com a TV e já chega a multimídia. Como recuperar o tempo perdido? Pela Internet?
Escola e cidadania...
Poderíamos sintetizar o longo relato acima dizendo que a escola do futuro tem de realizar a promessa moderna, iluminista, de emancipação, integrando-se ao universo da cultura pós-moderna: isso significa escola para todos com qualidade, isto é, com tecnologia e com educação para o uso das mídias.
Do ponto de vista da construção do conhecimento, isso significa antes de mais nada a integração de dois campos culturais: a educação e a comunicação, ambas estruturadas como espaços de luta entre grupos e interesses contraditórios, ambas importantes no processo de criação e transmissão da cultura. No campo da educação e no da comunicação, agentes e instituições se confrontam apropriando-se desigualmente do capital simbólico específico de cada um deles (Bourdieu 1994).
No Brasil, a história desses dois campos mostra trajetórias bem diferentes. No campo da comunicação, os principais atores são privados e o processo incorpora rapidamente as inovações técnicas. O papel do Estado tem sido mais próximo ao de cliente preferencial e generoso do que ao de instância de regulação. No campo da educação, ao contrário, os atores mais importantes são públicos, os investimentos, insuficientes e o processo tende a resistir à mudança, especialmente à incorporação de novas técnicas.
Enquanto a escola, pobre e abandonada, vive uma crise que não é só paradigmática, mas também de identidade e de auto-estima, perplexa diante da multiplicidade e da complexidade de suas novas tarefas, as mídias triunfantes invadem os espaços mais reservados do cotidiano, tornando-se extensões naturais de nossos sentidos, concretizando assim as profecias de McLuhan.
O capital cultural com melhor valor no mercado das trocas simbólicas está mais no campo da comunicação, seja no mundo real dos negócios (onde 30 segundos de publicidade podem valer o salário de dez mil professores), seja no mundo simbólico do imaginário popular, especialmente na percepção dos jovens, que sonham com a celebridade aparentemente fácil ofertada pelas mídias.
Na intersecção desses dois campos, ocorre o processo de socialização das novas gerações, processo extremamente complexo que integra de modo interativo todos os elementos do meio ambiente da criança. Nesse processo atuam muitas instituições: a família, a escola e a Igreja eram as principais. Agora atuam também nesse processo, de modo voluntário e insistente, inúmeras empresas produtoras e distribuidoras de "bens culturais": os sistemas de mídia (Belloni 1992 e 1994).
A escola ainda não conseguiu integrar esses bens culturais produzidos pelas mídias, e que são consumidos pela maioria das crianças, consumo este desigualmente distribuído entre grupos sociais. A escola de qualidade terá que integrar as novas tecnologias de comunicação de modo eficiente e crítico, sem perder de vista os ideais humanistas da modernidade (isto é, evitando aquele velho mecanismo que consiste em jogar fora a criança com a água do banho), mostrando-se capaz de colocar as tecnologias a serviço do sujeito da educação - o cidadão livre -, e não a educação a serviço das exigências técnicas do mercado de trabalho.
O campo da comunicação é um campo cultural que cresce em importância e visibilidade no mercado globalizado e está caracterizado pelo uso intensivo de meios tecnológicos de transmissão de informações. Esse campo se estrutura em sistemas de mídia que preenchem diferentes funções: ideológica, informativa, de entretenimento, cognitiva etc. É no cumprimento eficiente dessas funções que as mídias vão penetrando e interferindo na ação de outras instituições em outros campos, como a família, invadida pela moral das telenovelas e dos desenhos animados, ou a escola, que ainda não sabe lidar com suas mensagens e linguagens. Para não falar das religiões que tiveram que se adaptar a elas.
O campo da educação enfrenta, pois, mais este desafio: o de constituir-se em espaço de mediação entre a criança e esse meio ambiente tecnificado e povoado de máquinas que lidam com a mente e o imaginário. Cabe à escola não só assegurar a democratização do acesso aos meios técnicos de comunicação os mais sofisticados, mas ir além e estimular, dar condições, preparar as novas gerações para a apropriação ativa e crítica dessas novas tecnologias. É função da educação formar cidadãos livres e autônomos, sujeitos do processo educacional: professores e estudantes identificados com seu novo papel de pesquisadores, num mundo cada vez mais informacional e informatizado.
Isso exige transformações radicais no campo da educação: será preciso reavaliar teorias e reinventar estratégias e práticas. À universidade cabe investir na produção acadêmica de conhecimento novo e inovador, repensar aspectos teóricos e metodológicos e integrar efetivamente o ensino e a pesquisa.
A escola do presente e do futuro, aquela que todos queremos, tem de resgatar os ideais da modernidade clássica transformando-os para adaptá-los à modernidade radical, às infinitas possibilidades ofertadas pelas tecnologias de comunicação e de informação. Somente com a modernização radical do campo educacional - que vai da pesquisa acadêmica às estratégias políticas - poderá a escola cumprir sua função social: a de formar o cidadão autônomo, competente técnica e politicamente.
...comunicação e tecnologia
Em primeiro lugar, será preciso redefinir o papel do educador: será ele um engenheiro do conhecimento, misto de programador e artista, tutor a distância ou em presença, facilitador ou orientador de uma aprendizagem baseada em materiais multimidiáticos, ou um pesquisador, ator, com seus alunos, na construção do conhecimento? A complexidade de suas tarefas exige uma formação inicial e continuada totalmente nova. Como formar o professor que a escola do futuro exige? Na formação do professor do futuro está em jogo o futuro do professor, se me é permitido o trocadilho.
As respostas a essa pergunta crucial são muitas e estão longe de ser unânimes, mas parecem sinalizar uma tendência a se agruparem em torno da idéia de reflexão. Esse conceito amplo e fluido parece ser o mais utilizado por pesquisadores e formadores para referir novas tendências na formação de professores. Muitas concepções do professor e do ensino podem ser englobadas por essa concepção mais ampla: o professor que experimenta, o professor pesquisador na ação, o professor como pedagogo radical, e muitas outras. Todas essas novas tendências se declaram reflexivas (Garcia 1992, p. 59).
Não obstante a grande diversidade de propostas teóricas e metodológicas e uma certa "dispersão semântica", é possível identificar dois componentes comuns a essas novas propostas de formação de professores: por um lado, a idéia de pesquisa e de reflexão constante sobre a própria prática pedagógica (desde o construtivismo, entendida ela própria como um processo de pesquisa para construção do conhecimento), e, por outro, a convicção de que será fundamental estabelecer uma nova relação mais horizontal (menos verticalizada e autoritária) entre professores e alunos, entendidos como parceiros diferenciados no processo educativo (idem, p. 62).
Em tese, essas concepções seriam bastante propícias à integração, dos meios técnicos de comunicação e de informática, aos processos educacionais, uma vez que a reflexão sobre a própria prática "conduz necessariamente à criação de um conhecimento específico e ligado à ação, que só pode ser adquirido através do contato com a prática, pois trata-se de um conhecimento tácito, pessoal e não sistemático" (idem, p. 60).
Embora se possa considerar como autocomplacência de uma categoria profissional em crise de auto-estima, aquela velha atitude que consiste em evitar as novas tecnologias sob o pretexto de que elas assumiriam o papel do professor, desumanizando o processo de educação, também é preciso lembrar que sem uma formação adequada não se pode esperar que o professor resolva sozinho um problema cuja complexidade o ultrapassa. Ao contrário, o uso adequado das incríveis potencialidades oferecidas por aqueles meios representaria para o professor uma libertação das tarefas de "repetidor" que ocupam a maior parte de seu tempo, deixando-o livre para desempenhar múltiplos papéis mais criativos e mais interessantes (e, evidentemente, mais adequados aos tempos que correm).
Segundo Perriault, o papel do professor é "chamado a evoluir":
Quando estiver rodeado de mídias, ele não mais veiculará todo o conhecimento mas ajudará os alunos a assimilá-lo bem. Responderá às questões difíceis. No ensino a distância nota-se a importância crescente do telefone: os inscritos chamam o professor para `depanagens'. (Perriault, 1996, p. 82)
Do ponto de vista do macroplanejamento, é ilusório pensar que se fará economia de orçamento com o uso de tecnologias ou com o ensino a distância. Ao contrário do que se tem muitas vezes ouvido autoridades do setor declararem, a integração das novas tecnologias à educação não significará economia de custos: o professor terá que ser valorizado e sua formação inicial e continuada terá que ser repensada, além dos investimentos em equipamentos, é claro. Mas certamente o investimento em formação de professores com tecnologias resultará em aumento de produtividade dos sistemas e, portanto, a médio e longo prazo significará maior rentabilidade, evitando não só o desperdício com o fracasso escolar, como as frustrações decorrentes dele e da inadequação às demandas sociais.
O "método" mais geral da formação de professores sendo a reflexão, resta ainda definir o que seria essa formação. Quais critérios utilizar? Um elenco de "destrezas" necessárias à prática de um "ensino reflexivo" (Garcia, op.cit., p. 61)? Ou a reflexão sobre experiências inovadoras de utilização de meios técnicos para ir construindo novas metodologias, novos materiais, por exemplo?
Uma nova pedagogia já está sendo inventada que concebe as tecnologias como meios, linguagens ou fundamentos das metodologias e técnicas de ensino, sem esquecer de considerá-las como objeto de estudo e reflexão, assegurando sua integração crítica e reflexiva aos processos educacionais. Há pesquisadores que tendem a considerar a tecnologia como o fundamento dessa nova pedagogia (Pretto 1996). Mas nesse caso não correríamos o risco de vê-la submetida à lógica instrumental da produção industrial? Será possível escapar dessa lógica e assegurar uma autonomia relativa ao campo da educação?
Parece-me mais apropriado dizer que o fundamento dessa nova pedagogia tem de ser a pesquisa, como mecanismo central do processo de construção do conhecimento, do qual professores e alunos participem criativamente, redefinindo radicalmente os papéis e as relações entre eles e potencializando de modo inédito a construção coletiva do conhecimento.
A nova pedagogia deve permitir a apropriação dos saberes e das técnicas, incorporando-os à escola de modo a valorizar a cultura dos alunos e a criar oportunidades para que todas as crianças tenham acesso a esses meios de comunicação. Humanizar as máquinas de comunicar, dominá-las, sujeitando-as aos princípios emancipadores da educação, eis aí o desafio que está posto.
Em um outro momento afirmei que o confronto escola e televisão era, mais que nada, uma questão de linguagem (Belloni 1995a). Queria então enfatizar o caráter instrumental da tecnologia - que pode estar a serviço do "bem" ou do "mal" - e ressaltar que o meio é a mensagem e que as linguagens (inclusive a linguagem audiovisual e a informática) são fundamentos do pensamento e estruturam o conhecimento. Gostaria agora de destacar alguns aspectos técnicos dessa questão, sem perder de vista as variáveis externas ao campo da educação as quais em grande parte o determinam, embora não as integrando diretamente no campo de análise.
Como se apropriar dessas linguagens, dominar esses meios técnicos, integrando-os ao cotidiano da escola? Não há receitas prontas, mas alguns caminhos óbvios já estão delineados. Os tópicos que se seguem são sugestões do que poderia ser feito para a formação de professores capazes de iniciar esse processo de atualização que levaria a escola a realizar as promessas da modernidade num estilo pós-moderno. Eles representam uma receita técnica um tanto óbvia, mas tecnocrática, no sentido em que não são consideradas as determinantes sociais, políticas e econômicas.
• Produzir conhecimento
Em primeiro lugar, será preciso conhecer o assunto, produzir conhecimento novo, buscando pôr em evidência todos os aspectos da questão. Abre-se um novo e vasto campo de pesquisa que diz respeito aos "modos de aprendizagem mediatizada" (Perriault 1996, p. 241). Esse novo campo, necessariamente interdisciplinar, tem de considerar os dois principais componentes dessa nova pedagogia: a utilização cada vez maior das tecnologias de produção, estocagem e transmissão de informações, por um lado, e, por outro, o redimensionamento do papel do professor. Papel este que, ao que tudo indica, tende a ser cada vez mais mediatizado. O professor duplamente mediatizado: como produtor de mensagens inscritas em meios tecnológicos, destinadas a estudantes a distância, e como usuário ativo e crítico e mediador entre esses meios e os alunos.
Os aspectos cognitivos, especialmente aqueles relacionados com a "autodidaxia", por exemplo, são de extrema relevância para se compreender como funciona a auto-aprendizagem numa situação de ensino mediatizado. Os novos "modos de aprender" são ainda uma incógnita para a maioria dos professores.
A pesquisa sobre linguagens e potencialidades comunicacionais dos diferentes meios tecnológicos deve avançar nas tecnicalidades sem perder de vista os objetivos ou fins da ação educativa: é fundamental encarar as tecnologias como ferramentas, como meios, o que inclui as máquinas, mas também os programas, e sobretudo os saberes, instrumentos intelectuais e verbais (Trindade 1992). A introdução da imagem e seus suportes técnicos (a tela da televisão e do computador) no universo da palavra escrita suscita muitas interrogações ainda sem resposta. Como utilizar a imagem como fonte de saber? Como integrar esse novo conhecimento adquirido pelos jovens diante das muitas telinhas? Não o conhecimento de um determinado conteúdo, mas a competência específica de leitura de imagens e sinais eletrônicos?
Será preciso investir na análise, na seleção e na avaliação de experiências e materiais educacionais, sem deixar de promover a elaboração e a experienciação de estratégias e materiais inovadores.
Para desenvolver a pesquisa nessa área, o caminho não é simples: seria necessário um esforço no sentido de estimular a criação e a consolidação de linhas de pesquisa, integrando o ensino de pós-graduação e o de graduação, as vertentes teóricas e práticas, e trabalhar numa perspectiva interdisciplinar, integrando notadamente os campos da comunicação e da educação.
Infelizmente, esse aspecto é extremamente pouco desenvolvido em nossas universidades: o tema está longe de ser importante na produção científica do campo da educação e a integração entre graduação e pós-graduação é ainda bastante rara em nossos cursos de pedagogia e licenciaturas.
• Criar laboratórios
No contexto brasileiro, o desenvolvimento desse novo campo de pesquisa poderia acontecer nas universidades, com a instalação de laboratórios de multimeios que funcionassem como laboratórios de ensino e de pesquisa e como campo de estágio para estudantes de graduação e pós-graduação da área da educação, mas também de comunicação, de informática, de artes, letras e muitas outras.
As disciplinas de formação pedagógica (licenciaturas e pedagogia) poderiam ser desenvolvidas de modo integrado e interdisciplinar, ligadas aos laboratórios de ensino, equipados para a utilização e a produção de materiais pedagógicos. Os cursos de pós-graduação deveriam estar integrados com a graduação, tanto na realização de pesquisas quanto na prática docente ou monitoria em laboratório. Essa integração é condição necessária para o sucesso de qualquer experiência de modernização na educação: é aí que se pode produzir o conhecimento inovador, sob a forma de estratégias de utilização de materiais pedagógicos.
Num registro ideal, poderíamos imaginar a criação de centros de recursos públicos, a exemplo das maisons du savoir propostas por Perriault, midiatecas completas que coloquem à disposição dos usuários toda a riqueza de materiais e máquinas, permitindo a estudantes e professores realizarem suas pesquisas.
Serão imprescindíveis a interdisciplinaridade e a colaboração de profissionais de outros campos que virão necessariamente contribuir com o campo da educação, profissionais das áreas de comunicação e informática, principalmente mas não só, que trabalharão de modo integrado aos profissionais do campo da educação. Novas funções estão surgindo que exigem novas definições profissionais e de formação.
• Inventar metodologias de ensino
Com base em estratégias integradoras e interdisciplinares, não apenas integrar "disciplinas", mas desenvolver ações integradas entre os diferentes cursos de formação de professores e especialistas que culminem em estágios que levem para as escolas propostas inovadoras, integradas, orgânicas, propostas de pesquisa-ação que revolucionem o cotidiano escolar. Um primeiro passo importante pode ser dado com propostas de educação para a mídia que introduzam na escola a discussão sobre o tema.
É importante lembrar que a tendência atual é de uma maior mediatização do processo de educação (a exemplo e na esteira do que já ocorreu no processo de comunicação e em muitas outras esferas sociais) em direção ao estabelecimento de formas híbridas de educação e de formação continuada (mediatização do ensino presencial, ensino a distância, utilização de redes informáticas interativas etc.).
• Investir na produção de materiais
A ênfase deveria ser colocada no uso de materiais pedagógicos em suportes multimidiáticos (escrito, vídeo, áudio, multimídia) e nos equipamentos necessários para sua realização e leitura: é preciso equipar laboratórios e criar midiatecas, possibilitando aos estudantes a operação dos equipamentos e o contato com materiais pedagógicos em suportes tecnológicos.
É preciso desmitificar a tecnologia. O vídeo e a televisão são velhas tecnologias que não oferecem nenhum problema de operação. Há que aprender a avaliar, selecionar, criar estratégias de utilização. Quanto à informática, ela está se tornando uma linguagem dominante, e seu casamento com o vídeo e o texto, na multimídia, engendra a mídia do futuro. É preciso também considerar com atenção o seguinte conselho:
A elegância é uma qualidade estética feita de simplicidade e de graça que se presta a certas formas. Esse ponto de vista distancia o olhar sobre a tecnologia da educação, ajudando a atualizar o julgamento que se faz dela. Essa atualização é urgente pois uma autodidaxia importante se desenvolve desde há alguns anos nos jovens por meio das mídias. (Perriault 1996, p. 231)
Faz parte dos resultados dessa "autodidaxia" não apenas a desenvoltura com que os jovens manipulam os jogos eletrônicos, mas também a habilidade para julgar a qualidade técnica e a estética de qualquer material audiovisual. O que implica e exige materiais de boa qualidade didática (metodologias adequadas), mas também técnica e estética.
Segundo esse mesmo autor, a evolução do uso das mídias para a educação mostra tendências divergentes, que podem ser agrupadas em duas categorias básicas:
• mídias que põem em comunicação um ser humano e uma máquina, da qual ele extrai informações que transforma em conhecimento;
• mídias que ligam seres humanos entre si, para que eles troquem informações e juntos construam conhecimentos.
Na primeira categoria temos o ensino assistido pelo computador, os livros, vídeos e CD-ROMs, por exemplo; e na segunda temos as trocas telefônicas, consultas ao tutor via telemática, alguns usos das redes informáticas (Internet), videoconferências interativas etc.
Essa evolução estaria, segundo Perriault, mostrando um desenvolvimento mais rápido nos usos de meios da segunda categoria, o que sinalizaria para utilizações mais horizontais e democráticas - e humanizadas - que as possibilitadas pelas "máquinas de ensinar" skinnerianas.
Sem dúvida, as tecnologias podem ser novos e muito úteis meios de construir e difundir conhecimentos sem risco de desumanizar o ser humano. Tudo depende do modo como as utilizamos: se nos apropriamos de seu potencial pedagógico e comunicacional e as colocamos a serviço do homem ou se, ao contrário, nos deixamos dominar por elas, transformando-nos em consumidores de gadgets concebidos para um mercado de massa planetário.
Technology and teacher training: Towards a post-modern pedagogy?
ABSTRACT: Starting from a discussion on the controversial concepts of modernity and post-modernity, this text is an attempt to highlight the ideals and achievements of modern society in two increasingly complementary areas in the socialisation process of new generations: those of education and communication. Considering the growing importance of the communicational phenomenon in our globalised and technified contemporary society, education is required to serve as mediator between the child and an environment populated by ever more "intelligent" machines.
Using as theoretical basis the necessary and inevitable integration of new information and communication technologies into education field, the author attempts to mark out some paths towards an innovative view of teacher training which is indispensable for an improved schooling today and tomorrow.
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* Professora do Depto. de Metodologia de Ensino, Centro de Ciências da Educação, UFSC.
quinta-feira, 20 de setembro de 2007
A ecolha: "Educação a Chave de todas as portas."
A escolha do título foi inspirada pela celebre frase proferida por Monteiro Lobato que assim disse: "um país se faz com homens e livros.", representa nada menos que a essência do mundo está na Educação, por que sem a qual, somos testemunhas fiéis de toda sorte de barbárie, mazelas e desigualdades sociais, numa escala proporcional representada pelos níveis de educação de cada País, que justifica o provérbio: “quem tem mais chora menos que não tem competência não se estabelece”, ou seja, quanto mais são elevados os níveis de Educação de uma Nação, mais ela está estabelecida. Para corroborar o fato de que a Educação é a solução de grande parte das questões, trago a baila, a transcrição da passagem bíblica do velho testamento em Oséias 4:6, mensagem de exortação a nação de Israel, assim: “O meu povo está sendo destruído, porque lhe falta o conhecimento. Porquanto rejeitaste o conhecimento, também eu te rejeitarei, para que não sejas sacerdote diante de mim; visto que te esqueceste da lei do teu Deus, também eu me esquecerei de teus filhos.”
Para Paulo Freire em Pedagogia da Autonomia - Saberes necessários a prática educativa, diz que a educação é ideológica mas dialogante e atentiva, para que se possa estabelecer a autêntica comunicação da aprendizagem, entre gente, com alma, sentimentos e emoções, desejos e sonhos. A sua pedagogia é "fundada na ética, no respeito`a dignidade e `a própria autonomia do educando". E é "vigilante contra todas as práticas de desumanização". É necessário que "o saber-fazer da auto reflexão crítica e o saber-ser da sabedoria exercitada ajudem a evitar a "degradação humana" e o discurso fatalista da globalização".
Assim foi, é, e será – EDUCAÇÃO.
CLEUBER LOPES ALVES
Para Paulo Freire em Pedagogia da Autonomia - Saberes necessários a prática educativa, diz que a educação é ideológica mas dialogante e atentiva, para que se possa estabelecer a autêntica comunicação da aprendizagem, entre gente, com alma, sentimentos e emoções, desejos e sonhos. A sua pedagogia é "fundada na ética, no respeito`a dignidade e `a própria autonomia do educando". E é "vigilante contra todas as práticas de desumanização". É necessário que "o saber-fazer da auto reflexão crítica e o saber-ser da sabedoria exercitada ajudem a evitar a "degradação humana" e o discurso fatalista da globalização".
Assim foi, é, e será – EDUCAÇÃO.
CLEUBER LOPES ALVES
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